Nhá Chica será beatificada neste sábado

Rio – A Igreja no Brasil está em festa neste final de semana! No dia 4 de maio, dentro do mês de Maria, acontece a celebração para a beatificação de uma grande devota de Nossa Senhora da Conceição: Nhá Chica.

A cerimônia será presidida pelo eminentíssimo cardeal Ângelo Amato, prefeito da Congregação dos Santos, na cidade mineira de Baependi, dentro da circunscrição eclesiástica de Campanha. Receberá o legado pontifício dos cardeais, arcebispos e bispos o nosso venerando irmão dom frei Diamantino Prata de Carvalho, OFM, responsável pela causa de beatificação da nova beata genuinamente mineira.

Nascida em 1810, em São João del Rei (MG), ainda criança mudou-se com sua mãe para Baependi. Ali, numa modestíssima casa que ainda se conserva, no cimo de um morro onde se ergue hoje a Igreja de Nossa Senhora da Conceição, por ela construída, viveu virtuosamente. É interessante observarmos o que se lê em sua certidão de batismo, que declara claramente sua origem: “Aos vinte e seis de abril de mil oitocentos e dez, na Capela de Santo Antônio do Rio das Mortes Pequeno, filial desta Matriz de São João del Rei, de licença, o Reverendo Joaquim José Alves batizou e pôs os santos óleos a FRANCISCA, filha natural de Isabel Maria. Foram padrinhos, Ângelo Alves e Francisco Maria Rodrigues. O coadjutor Manuel Antônio de Castro”.

Humanamente, Nhá Chica tinha os traços de mestiça, tão frequentes em nosso Brasil real. São dignos, pois, de nossa gratidão. Nhá Chica era portadora de nobre missão: “Para todos tinha uma palavra de conforto e a promessa de uma oração”. Sua companhia diuturna era uma pequena imagem de Nossa Senhora da Conceição, em tosco oratório, ainda hoje venerado na igreja, conhecida na cidade como Igreja da Nhá Chica. Diante da bela imagem esculpida por hábeis mãos de artista, em cuja alma vicejava a fé, se reza a oração predileta de Nhá Chica, aliás, umas das mais belas preces compostas nos 2 mil anos de cristianismo: a salve-rainha.

Nhá Chica deixou em testamento a sua igreja para a Paróquia de Santa Maria que, aliás, contou com seu empenho financeiro nas suas melhorias. Mas Nossa Senhora queria mais alguma coisa e manifestou à sua serva seu desejo: “Queria um órgão para a igreja”. Nhá Chica, porém, não sabia o que era aquilo. Foi consultar o vigário local, monsenhor Marcos Pereira Gomes Nogueira, sobre o que era o órgão que Nossa Senhora desejava para a capela. Monsenhor Marcos lhe disse: “Órgão é um instrumento até muito bonito que toca nas igrejas, mas para isso precisa muito dinheiro!”…– “Mas Nossa Senhora queria. Na Rua São José, casa 73, no Rio de Janeiro, chegou um assim”, disse ela. Nhá Chica manifestara o desejo de Nossa Senhora, recorrendo ao seu auxílio para que o órgão fosse providenciado para ornar a sua igreja. Rapidamente as esmolas começaram a afluir abundantes às suas mãos. Foi encarregado da compra o senhor Francisco Raposa, competente maestro, que partiu para o Rio de Janeiro. O órgão foi despachado até Barra do Piraí (RJ) por via férrea. De lá até Baependi foi levado em carro de boi. Numa quinta-feira às 15h, ela fez tocar o sino, convidando o povo para a inauguração do órgão.

Começam a chegar os devotos, e a capela ficou lotada. O maestro subiu ao coro e, deslizando suas mãos sobre o teclado, qual não foi a sua surpresa: não se ouviu uma nota sequer! O que teria acontecido? “Com certeza estragou-se com a viagem em carro de bois” – diziam uns. –“Qual! Com certeza venderam coisa velha, estragada”, diziam outros. Nhá Chica chorava… De repente, acalma-se e diz: “Esperem um pouco”. E foi prostrar-se aos pés da Virgem, sua Sinhá. O povo esperava ansioso. Ela voltou serena e sentenciou: — “Podeis voltar para suas casas, porque o órgão não tocará hoje, mas amanhã às 15h (sexta-feira), dia da devoção de Nhá Chica. – “Nossa Senhora quer que entoem a ladainha”. E assim se fez. No dia seguinte, novamente o sino soava conclamando os fiéis, que, desta vez, foram em número maior, movidos pela curiosidade. E, como para Nhá Chica a graça de Deus era mais importante, às 3 horas da tarde em ponto, o maestro fez ecoar pela primeira vez por toda a igreja, ao som do órgão, a linda melodia da ladainha de Nossa Senhora! As lágrimas desciam dos olhos de Nhá Chica, mas desta vez lágrimas de alegria e felicidade.

Nhá Chica passou a sua vida de leiga consagrada levando as pessoas ao conhecimento de Cristo, pela devoção de Nossa Senhora da Conceição, numa bonita imagem por ela providenciada em terracota, até hoje venerada naquele monte sagrado de Baependi. Nhá Chica, que não sabia ler, tinha uma imensa alegria em que as pessoas lessem para ela a Sagrada Escritura. A sua alegria era ouvir a Palavra de Deus, e a sua vida se transformou pela Palavra de Salvação. Nhá Chica passou a sua vida cuidando das coisas de Deus, aconselhando as pessoas e vivendo em favor dos mais pobres. Com propriedade falou o nosso querido irmão dom Aloísio Roque Oppermann, SCJ, que instaurou o processo de beatificação de Nhá Chica quando era Bispo da Campanha (1988-1996).

Em Nhá Chica tudo é muito real, revestido de simplicidade e até de pobreza de recursos. “O Senhor virá para ser glorificado nos seus santos” (2Tss 1,10). Um casal não se sente diminuído ao lhe falarmos: “A sua filhinha é muito linda”. Embora reconheçamos, sem a mínima dúvida, que Jesus é o único santo, o Espírito distribui, entre os seus filhos e filhas, abundantes sinais de perfeição provindos da pessoa de Jesus. “Sede meus imitadores como eu o sou de Cristo” (1Cor 11,1). A Igreja precisa de modelos de santidade por mil razões. Mas destaco neste momento apenas que eles têm a razão esclarecida para entender o verdadeiro sentido das Escrituras”
Ao cumprimentar a centenária igreja da Campanha, que tantos vínculos tem com a arquidiocese do Rio de Janeiro, particularmente pela vida de dom Othom Motta, ilustre filho do clero carioca, e que santificou, como Nhá Chica, a vida do povo sul-mineiro como terceiro bispo da Campanha, neste ano de seu centenário de nascimento, queremos elevar a Deus, por intermédio de Nossa Senhora da Conceição, nossa ação de graças por esta leiga, agora beata, que no cotidiano e na simplicidade viveu a radicalidade do Evangelho. Que o exemplo de Nhá Chica, no Ano da Fé e da JMJ-Rio 2013, inspire aos jovens que é possível ser santo, porque é um dom de Deus. Por isso, a santidade não é uma meta inatingível, ao contrário, a santidade, como é a vida de Nhá Chica, consiste em ouvir a Palavra de Deus, se alimentar da Eucaristia, recorrer a Maria como caminho seguro para Jesus, e ter extrema e genuína caridade, a porta do céu.

Nhá Chica, rogai por nós!

* Dom Orani João Tempesta, cisterciense, é arcebispo do Rio de Janeiro.(JB)

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