Brasilia – Com cerca de 7 mil foliões, segundo a Polícia Militar, o Pacotão, bloco de carnaval mais tradicional de Brasília, saiu da 302 Norte, por volta das 16h30 de hoje (7), dando início a seu trajeto até a 504 Sul. A expectativa dos organizadores é que 15 mil pessoas pulem neste que é, de acordo com os organizadores, o bloco “mais político e filosófico” da capital federal. Dois anos depois de cair do trio elétrico em pleno Pacotão, Seu Cicinho, um dos fundadores do bloco, foi homenageado
Na concentração, pelo menos quatro bandas – Asé Dudú, Orquestra Percussiva Batukeijé, Patubatê, além do próprio bloco do Pacotão – tocavam simultaneamente músicas diferentes a poucos metros de distância umas das outras. Para o organizador Wilsinho Reggae, essa massa sonora de vários estilos ao mesmo tempo faz parte da identidade anárquica do bloco. “Nossa organização é justamente essa desorganização”, diz.
Na edição deste ano, foi feita uma homenagem a um dos fundadores do bloco, o jornalista aposentado e filósofo Seu Cicinho, de 75 anos. Há dois anos, o folião sofreu uma queda no trio elétrico, o que limitou sua movimentação nos últimos carnavais.
Diferente
“O Pacotão é um bloco diferente dos demais por sua consciência democrática e pela formação filosófica e apartidária. Porém somos políticos até a alma. Somos a expressão do pensamento aristotélico, segundo o qual o homem é um ser político. Tanto faz se contra a esquerda ou a direita, até porque quem manda no país continua sendo o PMDB, o importante é fazer críticas, seja a quem for. Para isso basta um pouco de inteligência”, explica Cicinho.
Este ano, a organização mirou críticas principalmente ao governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg, pela falta de apoio nas duas últimas edições do carnaval. “Ele é uma decepção porque figurou no meio político estudantil, defendia nossos festejos e, agora, ferra com os foliões. Mas isso não nos abate. Faremos das tripas coração para continuar fazendo o nosso carnaval”, diz Cicinho.
Já os foliões centravam críticas principalmente à presidenta Dilma Rousseff. Segurando um cartaz com o dizer “Fora Didi” e fantasiado de Itamar Franco, como faz desde 1994, o corretor de seguros Jafé Torres, 74 anos, fazia discursos contrários ao aumento da dívida pública brasileira. “O Fora Didi é uma provocação porque soube que este é o apelido que a Dilma mais odeia”, declara o corretor.
O porteiro Lino Francisco, 75 anos, fez um mosaico com diversas capas de revistas semanais críticas ao governo federal. Segundo ele, foi fácil juntar esse material. “Toda semana tem uma capa nova para ser colada aqui”, disse o folião, tendo às mãos uma mala simbolizando o dinheiro público desviado por causa da corrupção.
Saudosismo
Com experiência de mais de 15 Pacotões, a servidora pública aposentada Lúcia Hochreiter, 72 anos, diz que o Pacotão tem perdido um pouco da irreverência que sempre o caracterizou. “Provavelmente por ter uma tradição mais de esquerda, perdeu um pouco da ironia e acabou ficando menos divertido. Hoje o que vejo são críticas mais agressivas, mas no público, e não nos organizadores. Acho que isso reflete o momento político atual, de polarização, provocado pela mídia brasileira”, diz ela.
“Prova disso é que há um terreno fértil de assuntos que poderia ser explorados e que não foram, até por não terem sido mostrados pela mídia. Eu esperava ver referências ao helicóptero com cocaína, apreendido pela Polícia Federal. Dava até para fazerem uma associação do nome do bloco com os pacotes de drogas que foram encontrados. Perderam também a oportunidade de falar da violência que tem sido praticada pela Polícia Militar em Brasília, em São Paulo e no Paraná. Infelizmente, o Pacotão não é mais o mesmo”, acrescenta a aposentada.
No quesito fantasia, um dos destaques do Pacotão ficou com a atriz Wilma Ramos, 72 anos, vestida de bruxa. A personagem é conhecida do público brasiliense desde os anos 80, quando participava do programa infantil Carrosel, com o palhaço Cacareco, exibido na capital federal na época. A todo momento, pediam que ela posasse para fotos. “Desde 1982, venho aqui todos domingos e terças-feiras de carnaval. É sempre a mesma coisa: pessoas querendo registrar toda essa beleza que Deus me deu”, relembra.
Amazonianarede-Agencia Brasil