Prosamim 10 anos: um olhar necessário

Ronaldo Santos

 

Ronaldo Santos
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Ronaldo Santos*

A capital amazonense é recortada por dezenas de igarapés ou pequenos cursos de água que vão desaguar no grande rio Negro. Certamente é uma das capitais do Brasil cuja história secular é umbilicalmente ligada ao cenário hídrico-urbano. Isto é: não tinha como fugir da proximidade com os rios. Seguir seu curso era destino certo.

Por outro lado, com o crescimento das ruas sem ordem e controle, as populações passaram a usar as suas margens de forma indevida. Foi o que aconteceu nos últimos 40 anos, resultando em um degradante cenário socioeconômico destas áreas.

Para uma cidade com aptidão natural ao turismo ecológico ou de selva (sobretudo internacional) a situação destas áreas não poderia continuar desta forma, sem falar que o contexto social e sanitário daquelas famílias era deplorável.

O projeto e os empréstimos

Para tentar salvar este inestimável recurso ambiental e melhorar a vida destas pessoas, foi idealizado um grande projeto com enfoque social, ambiental e urbano-paisagístico chamado de Prosamim. Para quem não conhece Manaus (e mesmo para quem só ouviu falar em período eleitoral), este é um dos maiores programas de realocação de moradores às margens de rios situados em uma grande metrópole.

Ainda que concebido em 2003, as primeiras obras iniciaram efetivamente em 2006, portanto, completam-se 10 anos. Tempo necessário para uma reflexão de seu legado. Desta forma, é salutar um olhar sob o enfoque ambiental, econômico, social, paisagístico, urbanístico e visual. Deu certo e o que deu certo? É possível aprender com os erros do Programa? Há casos de sucesso?

Pelo tamanho da obra o governo não tinha dinheiro em caixa. Empréstimos a entidades nacionais e internacionais foi a saída (leia aqui). O dinheiro entrou nos cofres, as obras foram iniciadas e atualmente continuam os canteiros em pleno funcionamento em algumas áreas.

Dados do Tesouro Estadual apontam para o pagamento periódico da dívida, o que indica sua regularidade formal. Mas, é preciso olhar na prática e os dados além das planilhas e relatórios.

Pelo menos visualmente os primeiros igarapés do projeto indicam que há boas noticias.  As áreas do Centro e do bairro do Educandos, por exemplo, apresentam obras de infraestrutura que parecem ter alcançado os objetivos quanto à reurbanização e mudança nos aspectos arquitetônicos e de engenharia sanitária.

Auditoria e as Universidades distantes

Apesar destes dados iniciais e de haver a transparência mínima com os dados brutos expostos na internet, esta avaliação é unilateral (do próprio governo) e não há – pelo menos este dado não está disponível – uma auditagem independente dos resultados.

Bem verdade também que a prestação de contas frente à casa do povo (Assembléia) indica regularidade; mas nos relatórios do Tribunal de Contas (TCE) não há avaliação dos resultados em si, em sua essência – a não ser o olhar nos números. E se há vistorias à campo, este não foram divulgados.

Pelo vulto da obra, tamanho do empréstimo e impacto socioambiental,  igualmente há pouca avaliação científica disponível sobre o Prosamim – com honrosas e qualificáveis exceções (Aqui Dissertação de Mestrado). Diversas frentes de pesquisas são plenamente possíveis, dado o cenário diverso de áreas do conhecimento envolvidas. Em linhas gerais a academia se distanciou deste tema.

Um evento de avaliação

Um grande seminário poderia ser ponta-pé inicial para analisar os milhões de dados acumulados com este projeto. Envolver os cientistas locais e mesmo de fora, dissecar os resultados, propor ajustes, reunir estudos sobre o caso, conduzir uma grande publicação.

Em complemento, uma auditoria (não só numérica, mas de resultados) de uma fonte independente poderia ser uma saída. A proposta pode ser inclusive, uma forma de “vender” os bons resultados do Projeto – que existem e são plenamente auferíveis. Até porque, há outras cidades que se espelham no exemplo do Prosamim para implantarem em suas realidades.

A ideia não é para apontar erros ou buscar defeitos, mas para apontar caminhos e ajustes. Fazer jus à importância histórica que tem os igarapés e também o projeto, em sintonia à importância da própria capital.

Até lá, resta-nos, moradores e observadores do cenário, emitir nossa opinião. A próxima “parada” será a qualidade ambiental das águas impactadas pelo Programa. Voltaremos ao tema noutro texto.

  • Ronaldo Santos é engenheiro agrônomo, acadêmico de Direito e servidor federal de carreira.
  • Os arigos assinados, não refletem a opinião de Siet e são de inteira responsabilidade de seus autores

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