Brasília – Aécio e Marina endurecem críticas à gestão de Dilma Rousseff e sugerem agenda semelhante para relação com outros países.
Marca forte do governo petista, principalmente durante a gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a condução da política externa virou parte do confronto entre os principais candidatos à Presidência. Embalados pelo recente discurso da presidente Dilma Rousseff na abertura da Assembleia-Geral da ONU, os adversários Marina Silva (PSB) e Aécio Neves(PSDB) endureceram o tom contra a petista.
Dilma, que durante seu mandato enfrentou críticas por ter um estilo mais discreto que o de Lula e, por isso, não ter experimentado o protagonismo que o ex-presidente teve na cena internacional, enfrenta agora um contraponto, com posições idênticas das campanhas de Aécio e Marina.
De um lado, Dilma reclama que teve seu discurso “inteiramente distorcido” no ponto em que disse que o melhor caminho para combater conflitos é a negociação e questionou a eficácia dos ataques dos Estados Unidos à Síria e ao Iraque, contra o Estado Islâmico e contra ameaças terroristas.
De outro, Aécio e Marina apontam que o alinhamento ideológico do governo brasileiro dificulta aspectos práticos do comércio exterior. Ao criticar o posicionamento de Dilma na ONU, Aécio a acusou de defender o diálogo com extremistas como o Estado Islâmico, grupo radical da Síria. Aécio chegou a dizer que Dilma “propõe diálogo com um grupo que está decapitando pessoas”.
A campanha de Marina também embarca na acusação, apontando que Dilma não prestigia a diplomacia brasileira, sendo “leniente” com o terrorismo. “O discurso de Dilma na ONU representou um desprestígio para o Brasil. Ela se utilizou de um espaço importantíssimo para falar sobre a política local. Isso foi uma decisão pessoal dela, que não valorizou a diplomacia brasileira”, disse Maurício Rands, um dos coordenadores do programa de governo de Marina.
“Ela passou uma imagem de leniência com o terrorismo e de falta de solidariedade com as nações que estão engajadas na solução de conflitos na Síria, por exemplo. Dilma passou uma imagem no mínimo ingênua”, criticou Rands.
Marina, em seu programa de governo, reagiu à intensificação ocorrida nos últimos anos das trocas comerciais com a China, que desde 2009 é o principal parceiro comercial do Brasil. A candidata do PSB defende a retomada do comércio mais intenso com os Estados Unidos, tanto é que sua agenda de campanha incluiu uma viagem a Washington, na semana passada, com o objetivo de sinalizar a empresários norte-americanos sua intenção de estabelecer novas parcerias, caso ela vença as eleições.
A campanha de Marina avalia que falta ao governo de Dilma “maturidade” para superar os problemas diplomáticos ocorridos com os Estados Unidos. Um exemplo clássico de divergência citado pela campanha é o episódio da espionagem.
Para Rands, Dilma tomou a posição correta ao reagir com firmeza em relação à espionagem norte-americana, que atingiu empresas brasileiras e até e-mails pessoais da presidente. No entanto, ele critica a postura da petista ao dizer que ela “não colocou a energia necessária para superar este incidente e não permitir que ele influenciasse nos pontos em que as duas nações têm de convergência”.
“Há um potencial grande a ser explorado na relação entre Brasil e Estados Unidos no campo da tecnologia, do comércio e entendemos que houve um descuido do atual governo em relação a isso. Não houve maturidade para entender que, em diplomacia, é necessário”, disse Rands.
O programa de Marina deixa clara sua proposta de alinhamento preferencial com os Estados Unidos, em detrimento das trocas com a China. “Os Estados Unidos dão sinais de reativação de sua capacidade produtiva, reorientando gradualmente a matriz energética. A China sofre diminuição em sua taxa de crescimento, ainda expressiva, e passa a privilegiar o consumo no lugar do investimento”, diz o texto do programa de governo de Marina.
A presidente Dilma não divulgou programa de governo, no entanto, defende que a prática de seu governo tem sido manter as trocas comerciais com os Estados Unidos. Dilma defende que mantém relações prósperas com o governo americano, apesar das rusgas existentes e explicitadas em seus discursos, inclusive na ONU.
As revelações feitas em 2013 sobre a prática de espionagem, na avaliação do próprio governo, não influenciaram na relação comercial.’
‘Porosidade’
A reação do governo brasileiro foi de propor na ONU a elaboração de um marco civil global para a governança e uso da Internet e de medidas que garantam a proteção dos dados, proposta que contou com apoio da Alemanha.
Ao se contrapor à ideia já anunciada pela presidente Dilma Rousseff de criar um conselho de política externa, Marina Silva propõe em seu programa de governo uma maior “porosidade” do Ministério de Relações Exteriores (MRE), ponto que tem sido entendido como uma abertura da candidata a participação mais efetiva de ongs nas decisões internacionais.
“O Ministério das Relações Exteriores poderia ter sido mais valorizado nos últimos anos. Poderia ter sido fortalecido em diálogo com outros órgãos do Estado brasileiro e instâncias da sociedade civil, mas a instituição foi esvaziada com a partidarização ou ideologização da política externa”, diz o texto divulgado pela candidata do PSB.
“Para colocar outras vozes no debate sobre os rumos de nossa ação externa, não é necessário criar um conselho com atribuições paralelas. Propomos aumentar a porosidade do Itamaraty aos influxos externos, seja do Estado, seja da sociedade, o que começa a ser feito pela gestão atual da Casa de Rio Branco”, diz o texto.
No entanto, a própria campanha de Marina tem se empenhado em desfazer a ideia de que ela delegaria às ongs papel preponderante nas decisões, fama que Marina adquiriu quando conduziu o Ministério do Meio Ambiente, durante o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Isso é uma caricatura”, defendeu Rands.
O que Marina propõe uma abertura maior do governo para o diálogo com ongs, com associações do setor produtivo, com associações de empresários, com ambientalistas, com a academia, com o objetivo de saber das reais necessidades das pessoas, para melhor representa-las na política externa”, justificou.
“O fundamental é resgatar o prestígio do Ministério de Relações Exteriores. Nosso país tem um dos melhores corpos diplomáticos do mundo e isso precisa ser melhor explorado”, justificou Rands.
Fonte: IG Brasília