Brasília – O voto do ministro Celso de Mello, que será dado na próxima quarta-feira (12), decidirá se o Supremo Tribunal Federal (STF) determinará a perda do mandato de três deputados federais condenados no processo do mensalão: João Paulo Cunha (PT-SP), Pedro Henry (PP-MT) e Valdemar da Costa Neto (PR-SP). Se aprovada, a cassação só ocorreria após o trânsito em julgado do processo, quando não há mais possibilidades de recursos.
Até a sessão desta segunda (10), quatro ministros – Joaquim Barbosa, Luiz Fux, Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello – entenderam que a decisão é definitiva e não precisará passar por deliberação da Câmara dos Deputados. O ministro Celso de Mello já afirmou, durante os debates, ser favorável a essa tese.
“Sem a posse plena dos direitos políticos ninguém pode permanecer no desempenho de uma função pública, nem aspirar à investidura. Uma das condições da elegibilidade é a posse plena dos direitos políticos”, disse Celso de Mello nesta segunda durante a sessão.
Para outros quatro ministros – Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Dias Toffoli e Cármen Lúcia – a Câmara é que terá que decidir se cassa ou não os mandatos após abertura de processo interno.
Após registrado o empate sobre o tema, o presidente do STF, Joaquim Barbosa, decidiu, antes do voto de Celso de Mello, encerrar a sessão, em razão do horário. Celso de Mello disse, ao final da sessão, que estava pronto para votar, mas que Barbosa pediu a ele para deixar o voto para quarta.
Durante os debates no Supremo, houve divergência porque o artigo 55 da Constituição estabelece que, no caso de deputado que “sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado”, a perda do mandato “será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta”.
Já o artigo 15 da Constituição estabelece que a perda dos direitos políticos se dará no caso de “condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos”. Na avaliação de alguns ministros, o mandato parlamentar faz parte dos direitos políticos. Outros ministros discordaram.
Relator e revisor
Na sessão anterior, o relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, e o revisor da ação penal, Ricardo Lewandowski, divergiram sobre o tema.
“Nosso papel é o de guardião da Constituição, é dizer o que é a Constituição. Causa-me espécie, desconforto, a perspectiva de dizermos que pessoa condenada à privação de liberdade por 10, 15 anos, possa exercer um mandato parlamentar”, disse nesta segunda Joaquim Barbosa.
O revisor do processo, por sua vez, entendeu que a Câmara deveria decidir. “Tenho certeza que a Câmara vai saber a gravidade desse caso.”
Presidente da Câmara discorda
O presidente da Câmara, Marco Maia, afirmou, há duas semanas, que a Constituição “é muito clara” ao afirmar que somente a Câmara pode determinar a perda de um mandato. Disse ainda que, caso o Supremo decidisse pela cassação automática, a Câmara debateria como proceder.
João Paulo Cunha (PT-SP) foi condenado a 9 anos e 4 meses de reclusão, Valdemar da Costa Neto (PR-SP) pegou 7 anos e 10 meses, e Pedro Henry (PP-MT) teve pena de prisão fixada em 7 anos e 2 meses. Deles, somente Cunha deve cumprir pena em regime fechado, em presídio de segurança média ou máxima. José Borba teve a pena transformada em restrição de direitos políticos e multa.
O Código Penal estabelece que penas entre 4 e 8 anos são cumpridas em regime semiaberto, em colônia agrícola ou industrial. Pelo entendimento dos tribunais, quando não há vagas em estabelecimentos do tipo o condenado pode ir para o regime aberto, quando o réu dorme em albergues. Se também não houver vagas, pode haver liberdade condicional. Acima de oito anos, o regime é fechado, em prisão de segurança média ou máxima.
Votos pró-decisão do Supremo
Em voto proferido nesta segunda, o ministro Luiz Fux afirmou que o Supremo tem o “poder-dever” de determinar a perda do mandato parlamentar em decorrência de condenação criminal.
“Trata-se de saber se o Supremo tem que cumprir o seu poder-dever de cassar o mandato em razão de uma condenação criminal. […] A perda do direito político importa não só ao direito de concorrer, mas também ao direito de voto, de sufrágio.”
Durante o debate, Gilmar Mendes disse que os crimes abordados são muito graves e, na avaliação dele, isso deve ser levado em consideração para a cassação. “São infrações graves, que constituem improbidade administrativa. […] A possibilidade de ter liberdade restrita e continuar no mandato não é hipótese aceitável”, disse Gilmar Mendes.
Votos pró-decisão da Câmara
A ministra Rosa Weber foi a primeira a votar nesta segunda e disse que “em época de crise de representatividade” parece “tentadora” a interpretação da Constituição Federal que retira do Legislativo a responsabilidade de decidir sobre a cassação dos mandatos de parlamentares condenados criminalmente.
Na avaliação da ministra, ao ser condenado o réu perde os direitos políticos, ou seja, o direito de ser eleger e ser eleito, não o mandato que eventualmente exerça.
“O mandato não se confunde com o direito político que o fundamenta. […] Ainda que a suspensão dos direitos políticos (eleger, ser eleito ou reeleito) seja efeito direto da condenação criminal transitada em julgada, a perda de mandato eletivo de deputado e senador restará condicionada à manifestação nesse sentido da maioria objetiva da respectiva casa legislativa”, disse Rosa Weber.
Dias Toffoli destacou que a perda do mandato “não é automática”. “Depende do juízo da casa parlamentar. A Constituição outorga ao parlamento a conveniência de um juízo político.”
A ministra Cármen Lúcia defendeu a perda do mandato com a condenação criminal, mas destacou que essa decisão deve ser tomada pelo Poder Legislativo, em respeito ao princípio da separação de poderes. “Há de se esperar responsabilidade de todos os poderes, como se esperam de nós e estamos cumprindo”, disse.
“Estamos todos de acordo de que, com uma condenação dessa natureza, se torna incongruente o exercício do mandato. Estamos a dicutir, simplesmente, como interprertar e aplicar a Constituição”, destacou a ministra.
O ministro Ricardo Lewandowski votou na semana passada e afirmou que a decisão de determinar a perda do mandato pode levar a um “conflito institucional” entre Legislativo e Judiciário. “Qualquer providência, além dessa, teria potencial de indesejável conflito institucional.”
Pedido de prisão imediata
Depois de decidir sobre perda dos cargos, os magistrados ainda precisam concluir a discussão sobre o ajuste de multas e votar sobre o pedido de prisão imediata feito pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, para 23 dos condenados, já que dois tiveram as penas de prisão substituídas por restrição de direitos – além de Borba, o ex-secretário do PTB Emerson Palmieri.
Lewandowski propôs reduzir em até um terço as multas impostas a 16 dos 25 condenados durante o julgamento da ação penal. Ele pediu a adoção de um “critério objetivo” e sugeriu reduções que seguissem os critérios de fixação das penas de prisão. Os demais ministros ainda precisam se posicionar sobre a proposta.
Sobre a prisão imediata, há ministros que defendem que se espere o trânsito em julgado. Para ex-ministros do Supremo, a lei garante que a sentença seja cumprida somente quando não houver mais possibilidade de recursos. Gurgel tem insistido no pedido para cumprimento imediato da decisão.