Manaus, AM – Na manhã desta sexta-feira, dia 1º de setembro, o delegado-geral da Polícia Civil do Amazonas, Frederico Mendes, juntamente com o delegado-geral adjunto da instituição, Ivo Martins, apresentou durante coletiva de imprensa realizada às 10h, no Auditório José Elcy Barroso Braga, localizado no prédio da Delegacia Geral, a conclusão do Inquérito Policial (IP) que apurou as autorias e as circunstâncias das mortes de 56 detentos que cumpriam pena no regime fechado do Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), localizado no quilômetro oito da Rodovia Federal BR-174. O massacre aconteceu no dia 1º de janeiro deste ano.
Participaram ainda da coletiva a delegada Emília Ferraz, corregedora auxiliar da Polícia Civil na Corregedoria-Geral do Sistema de Segurança Pública do Amazonas, e os delegados Tarson Yuri e Rodrigo Azevedo, titular e adjunto, respectivamente, da 4ª Seccional Oeste e Delegacia Especializada em Homicídios e Sequestros (DEHS).
O delegado-geral enfatizou que após os crimes foi criado um grupo de trabalho para investigar as mortes que aconteceram na unidade do sistema prisional do Estado.
O delegado Ivo Martins atuou como presidente do grupo e coordenou, juntamente com a delegada Emília Ferraz, os trabalhos desempenhados pelos delegados Tarson Yuri Soares, Rodrigo Azevedo e Rodrigo de Sá. Este último titular do 20º Distrito Integrado de Polícia (DIP). Além disso, dez investigadores e dois escrivães integraram o grupo de trabalho.
Durante a coletiva o delegado Ivo Martins relatou que 210 detentos foram indiciados por participação nas mortes das 56 vítimas do Compaj. A autoridade policial informou que foram feitas perícias nos locais onde ocorreram as mortes e, ainda, realizados exames de necropsia e Ácido Desoxirribonucleico, também conhecido como DNA, nos corpos.
Também foram feitas análises às imagens captadas pelas câmeras do circuito interno da unidade prisional. Martins destacou que o Serviço de Inteligência do Sistema de Segurança Pública tinha informações de que poderiam ocorrer rebeliões nas unidades prisionais do Estado.
“Os informes de inteligência davam conta de que iriam ocorrer eventuais rebeliões nas unidades prisionais, mas isso não significava dizer que, de fato, iriam acontecer. Também não sabíamos a data precisa. O conjunto fático de inquéritos trabalhou com várias situações, 210 foram indiciados, mas nós ouvimos vítimas de constrangimento, tortura e outros tipos de procedimentos. Ouvimos agentes de ressocialização e autoridades em relação a isso. Enfim, é uma gama muito grande de informações que obtivemos, de testemunhas, de detentos, até dos indiciados, informações sigilosas e confidências, inclusive de outros estados, que nos fez compreender como esse evento aconteceu”, destacou o delegado-geral adjunto.
Os delegados que integram o grupo de trabalho relataram que 350 pessoas foram ouvidas no IP, que iniciou no dia 9 de janeiro e foi concluído nesta semana, precisamente no dia 31 de agosto.
O documento possui, aproximadamente, 2,6 mil folhas com materiais diversos, entre oitivas, fotos, áudios, laudos dos exames de necropsia e DNA feitos nos corpos, ofícios que foram remetidos a órgãos, incluindo a empresa Umanizzare Gestão Prisional Privada. Também foram acrescentadas no IP imagens de vídeos das câmeras do circuito interno do Compaj, que também foram analisadas.
Emília Ferraz ressaltou que no curso das investigações ficou comprovado que as mortes na unidade prisional ocorreram por rivalidade entre duas facções criminosas: Família do Norte (FDN) e Primeiro Comando da Capital (PCC), que atuam no Estado e buscavam ter o domínio dentro dos presídios em Manaus. Ferraz explicou que a ordem para o massacre partiu do líder da FDN, José Roberto Fernandes Barbosa, o “Zé Roberto da Compensa”, que está cumprindo pena em um presídio federal na cidade de Campo Grande, capital do estado de Mato Grosso do Sul.
A delegada informou que “Zé Roberto da Compensa” ordenou que detentos identificados como “Maguila” e “Caroço”, que comandou a ação e esses dois detentos passaram as coordenadas para que outros nove presos colocassem o plano em prática. “Maguila” e “Caroço” coordenaram toda a ação dentro do presídio.
“Nos autos temos relatos de testemunhas oculares informando que foi lida uma carta em reunião, dentro de uma das celas do Compaj, determinando, especificamente, como se daria o massacre.
Foi estabelecido que, a partir da última visita daquele dia, eles entrariam em campo, invadiriam a portaria e fariam reféns para que não houvesse o controle estatal e começariam a chacina propriamente dita. É bom ressaltar que outra motivação seria o comportamento dos presos do PCC dentro do sistema prisional. Em várias oitivas, inclusive de agentes de ressocialização, ficou bem claro que eles faziam chacotas com os presos da FDN. Uma motivação muito forte que todos eles apresentaram era essa, o comportamento dos internos do PCC em relação aos familiares e presos da FDN”, disse Ferraz.
A autoridade policial afirmou que “Maguila” e “Caroço”, juntamente com outros 15 detentos, foram transferidos para presídios federais no dia 11 de janeiro deste ano. Emília Ferraz explicou, ainda, que os alvos principais eram certos. “Algumas vítimas, como “Velho Sabá”, não era integrante do PCC, mas era um dos alvos. Outros indivíduos eram estupradores, além de presos vulneráveis e membros do PCC. Em algumas situações as vítimas já entraram no presídio com a sentença de morte decretada”, afirmou.
Dinâmica da ocorrência
O delegado Rodrigo Azevedo informou que a rebelião iniciou, exatamente, às 15h59, quando alguns detentos que estavam custodiados no Pavilhão Três, onde estavam os comandantes da FDN, renderam os agentes de socialização. Em seguida trocaram tiros com a guarnição da Polícia Militar que estava na Portaria Três do presídio para ter acesso a todos os presos de uma área chamada “Seguro”, local onde ficavam custodiados os presos considerados vulneráveis e 26 detentos da facção criminosa PCC. Desse local foram mortos 23 presos do PCC.
Ao longo coletiva o delegado Tarson Yuri explicou, também, que a massa carcerária avançou no corredor para tomada do “Seguro”. Durante a rebelião foram quebradas várias partes dos telhados do presídio para retirada de integrantes da FDN que estavam custodiados na área chamada de “Seguro”.
“Os detentos escreveram a sigla FDN nas paredes com sangue das vítimas para representar a vitória da facção. Membros do PCC atearam fogo em colchões nas entradas das celas para tentar impedir que os integrantes da FDN conseguissem entrar nos espaços. Alguns detentos do PCC tentaram fugir por uma janela, de uma das celas, que foi serrada, mas foram alcançados pelos presos da FDN e foram mortos”, relatou.
Envio do IP à Justiça
Para concluir, o delegado-geral da instituição informou que o IP será remetido à Justiça na próxima segunda-feira, dia 4. Frederico Mendes parabenizou todas as pessoas envolvidas na elucidação das mortes no Compaj.
“A Força-Tarefa foi criada no sentido de elucidar os crimes. A Polícia Civil do Estado do Amazonas está de parabéns, pois esse é um fato inédito. Esse é o maior Inquérito Policial dentro de apuração de crimes no presídio. Quero parabenizar toda a equipe comandada pelos delegados Ivo Martins e Emília Ferraz, que não mediram esforços para elucidar todos os fatos da ocorrência. Os meus parabéns também se estendem aos servidores do Departamento de Polícia Técnico-Científica (DPTC) da SSP-AM, que em tempo recorde conseguiram identificar aquelas pessoas que foram decapitadas ou esquartejadas. Este foi um trabalho exemplar da Polícia Civil do Estado do Amazonas”, concluiu Mendes.
Amazonianarede-SSP