Prestação de contas da FAF questionada e MP pede afastamento de Dissica

Ilustração
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Amazonas – Em meio a escândalos envolvendo a FIFA, entidade máxima do futebol no mundo, a Federação Amazonense de Futebol (FAF) está na mira do Ministério Público do Estado (MPE), que questiona as prestações de conta dos últimos 10 anos da entidade.

De acordo com a promotora de justiça, Kátia Maria Araújo de Oliveira, a ação que questiona a prestação de contas da FAF é oriunda de outras medidas, nas quais a permanência de Dissica Valério Tomaz, atual presidente da entidade, no cargo por mais de oito anos, o que vai de encontro ao texto da nova “Lei Pelé”.

– Em 2009 ingressei com uma ação porque a FAF não registra seus atos no cartório de registro de pessoas jurídicas desde 1985, então ela estava praticamente sem administração. A ação pedia para que fosse nomeado um interventor para organizar a entidade. Foi quando o atual presidente Dissica foi nomeado. Eu recorri e consegui que fosse nomeado o Dr. Alcebíades de Leiros Cavalcante, só que o Dissica entrou com um recurso no TJ através de uma liminar e continuou no cargo. Este processo não teve êxito.

Em 2014 ingressei com uma nova ação por causa da nova Lei Pelé, que determina que os administradores das entidades de desporto não podem ficar mais de oito anos no poder. Ou seja, é permitido um mandato de quatro anos, uma reeleição por mais quatro anos e pronto. Se a entidade quiser um administrador que esteja há mais de 8 anos no poder, ela fica proibida de receber repasses públicos – explicou.

Munida do texto, a promotora decidiu entrar com a ação de prestação de contas que está em trâmite atualmente, já que Dissica está há mais de oitos à frente da entidade. Ela menciona o caso da prestação de contas de 2012, que para a promotora, não foi de fato apresentada, sugerindo inclusive o afastamento de Dissica por conta do fato.

Falta muita informação. Não é só apresentar um documento e dizer “prestei contas”. Uma vez que a prestação de contas não é aprovada, quem prestou tem que ser afastado”

Kátia Maria Araújo de Oliveira Promotora do MPE

– Ingressei com a ação de prestação de contas pedindo que ele [Dissica] apresentasse a prestação de contas dos 10 últimos anos da entidade para verificar se havia esse repasse de verba pública. Foram constatados alguns repasses em 2012 e ele apresentou um Boletim de Ocorrência (B.O.) afirmando que não poderia prestar contas daquele exercício por conta de um roubo que teria acontecido na sede da Federação, onde todos os documentos referentes àquilo foram levados. Mas você sabe que nos dias de hoje você não tem documento apenas no papel.

O presidente deve ter uma conta bancária, a própria entidade também. Era tão fácil pegar essa documentação e apresentar. Não quis apresentar por quê? Ou seja, essa prestação de contas não pode ser considerada aprovada, já que a mesma não obedece às leis da contabilidade pública. Falta muita informação. Não é só apresentar um documento e dizer “prestei contas”. Não é assim. E uma vez que a prestação de contas não é aprovada, a pessoa que prestou tem que ser afastada e é preciso nomear alguém para que seja feita essa verificação – afirmou Kátia.

A promotora reconhece que o restante das prestações de conta foram apresentadas, o que é questionado neste momento é a falta de informações e a validade das mesmas, levando em conta os princípios da contabilidade pública voltada a entidades do 3º setor.

– É preciso dizer quantas pessoas trabalham na entidade, quanto essas pessoas ganham e etc. Como em qualquer outra entidade. Se essas contas não são prestadas, como vamos saber se essa instituição está funcionando da forma adequada, se ela está aplicando seus recursos no futebol amazonense? Não tem como saber – enfatizou.

O presidente Dissica se defende e diz que na FAF esta tudo legal
O presidente Dissica se defende e diz que na FAF esta tudo legal

A ação de prestação de contas possui duas fases: na primeira, o juiz julga se aprova a prestação de contas ou não. Na segunda fase vem a penalidade, ou o que vai acontecer com o administrador que não presta contas de forma adequada, caso seja constatada tal situação. Para a promotora, o ideal seria que Dissica fosse afastado pelo menos temporariamente para que um interventor possa realizar uma auditoria na FAF, além da cassação da titulação de utilidade pública.

– A FAF tem a titulação de utilidade pública. Qualquer entidade que tenha essa titulação usufrui de vários benefícios fiscais. Há algumas isenções e imunidades e isso implica em verba pública ainda que indireta porque uma vez que ela goza desses benefícios, ela não paga determinados tributos, impostos, taxas e etc. E esse é um dinheiro público que indiretamente fica com ela. Então é preciso prestar contas desse dinheiro, ainda que ela não receba nada público, seja por contrato ou subvenções, o simples fato de ter a titulação de utilidade pública já implica em verba pública. Então também queremos que seja cassada essa titulação – continua.

Nas redes sociais, internautas ironizam o mandato de Dissica (Foto: Reprodução)

Kátia finaliza dizendo que esta pode ser apenas a “ponta do iceberg”, e que mais coisas precisam ser analisadas dentro da federação.

– Onde estão aplicando essas isenções e imunidades? Não é no nosso futebol, né? O nosso futebol não existe mais. Pode ter um campeonatozinho, mas ainda sou da época que a gente ia ao Vivaldão ver um Rio-Nal lotado. Como isso acabou? Por que isso acabou? Aí você vai implicar em tudo que há ao redor disso, que é o patrocínio, que são as transmissões televisivas.

Se for revirar isso tem muita coisa. Então, o básico no momento é saber como está a FAF e pra onde estão indo as verbas que são recebidas. Só não venha dizer que não funciona, porque se não tivesse o dinheiro público lá, como ela ia funcionar, porque os nossos campeonatos não rendem nada? Televisão não transmite quase nada daqui. Não existe transferência de jogadores, o que rende um percentual para a federação.

Tem só a verba que a CBF repassa para as federações mensalmente. O que ocorreu com a Copa do Mundo? Na Copa com certeza saíram recursos para a Federação daqui. E cadê? Aí temos essa imensa arena que não é utilizada. Foi construída para três jogos e quem utiliza realmente não serve à sociedade amazonense, porque são jogos de fora que são colocados aqui para gerar verba para a manutenção daquela arena, que é caríssima. Nós temos que saber o que está acontecendo aqui – finaliza.

Despacho na próxima semana

O processo que pede a prestação de contas está em tramitação na 19ª Vara Cível. O juiz titular é Rogério José da Costa Vieira. De acordo com ele, o processo está em andamento, sendo analisado. – Existe atualmente uma lista de processos tramitando na Vara e estão sendo analisados um por um. Sobre este processo especificamente, deve haver um despacho na próxima semana – disse o juiz, por meio da assessoria de imprensa. O processo, de número 0614961-18.2014.8.04.0001, está disponível para ser consultado no site do TJAM, pelo link: http://consultasaj.tjam.jus.br/cpopg/open.do

A FAF se defende

A advogada da FAF, Maria Benigno, rebateu as afirmações da promotora Kátia Maria quanto a validade das prestações de contas que, segundo ela, foram aprovadas por uma comissão formada pelos presidentes dos clubes e ligas do Amazonas.

– O MP pede que a federação apresente as contas ao juízo. A prestação de contas de todos esses anos foi apresentada ao órgão competente que é a sua assembleia geral. A cada final de ano e início do ano seguinte é feita uma assembleia geral onde todos os presidentes de liga e clubes comparecem e formam uma comissão específica que analisa essas contas que, por meio de votação, são aprovadas ou não – explica.

Faz muito temo que Dissica comanda da FAF, mas agora poderá mudar
Faz muito temo que Dissica comanda da FAF, mas agora poderá mudar

Segundo a advogada, a suspeita de uso de dinheiro público por parte da FAF não tem fundamento, esclarecendo que a federação se mantém com recursos da entidade máxima do futebol brasileiro, a CBF, além de contratos privados.

Não dá pra dizer que o Dissica está se mantendo no poder a custa de impedir que outros se candidatem e se elejam. Simplesmente não aparece nenhum candidato”

Maria Benigno advogada da FAF

– O MP pede essa prestação de contas em juízo imaginando que a federação é bancada por recursos públicos quando na verdade não é. A FAF se mantém com recursos provenientes da CBF e outros contratos privados e isso já foi apresentado no processo. A ação de prestação de contas só é válida quando o alvo da ação não o fez. Nesse caso a federação fez. Mas em todo caso, quando foi intimada apresentou toda a documentação. A promotora entende que a documentação não é a correta, mas nós apresentamos. Aguardamos o juiz decidir conforme a lei para este tipo de ação – afirma.

A advogada também afirma que nas prestações de contas não há a falta de informações, e que todos os documentos solicitados pela Justiça já foram apresentados.

– São mais de mil folhas dentro das quais estão apresentados todos os documentos, desde o estatuto e documentos de cada uma das ligas. Agora compete ao júri o que vai acontecer com o processo, porque neste momento a promotora já apresentou a representação dela, a FAF já fez a sua e o juiz vai decidir se são válidos os documentos da federação ou se ele vai requerer outros – explica.

Sobre a ação que questiona a permanência de Dissica no poder, Maria Benigno afirma que Dissica continua no poder por falta de oposição e que não existe qualquer manobra para mantê-lo no cargo.

– Muita gente critica e tudo, mas não aparece nenhum concorrente para as eleições. Não dá pra dizer que o Dissica está se mantendo no poder a custa de impedir que outros se candidatem e se elejam. Simplesmente não aparece nenhum candidato. Não há nada na lei que impeça isso – disse ela.

Ainda de acordo com a advogada, a federação está aberta para qualquer possível determinação da Justiça, inclusive para uma auditoria proposta pelo MP.

– Não tem problema nenhum de haver uma auditoria. Acredito que isso tenha vindo à tona por conta dessa situação da FIFA, mas acho que quanto mais transparente as coisas forem, melhor – disse ao GloboEsporte.com.

Amazonianarede-G1.AM, esporte

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