O velho e tradicional Parque Amazonense

13-07almirAmir Carlos*

Olha o disco voador!

Era assim que o vendedor anunciava a iguaria tão conhecida de todos nós, nos jogos realizados no velho e tradicional Parque Amazonense. Era um sanduiche de pão redondo (disco voador), com picadinho e acompanhado de pimenta malagueta acondicionada em vidro de “bromil”, atada em um cordão e amarrada ao tabuleiro. O freguês comprava o sanduiche e se servia do molho de pimenta, que ardia até na alma! Que delícia era aquela guloseima, feita por um senhor de nome Vasco, daí o nome: Disco Voador do Vasco…
O velho Parque Amazonense, localizado na Rua Belém, no Beco do Macedo, foi palco de jogos inesquecíveis, como o Nacional X Fast, em que um torcedor levantou uma faixa onde se lia: Fast Campeão. Tomou dois gols em menos de dois minutos, que mudaram a história do jogo e do campeonato. Assisti ao jogo América(RJ)1 X 1 Nacional, outro jogão, mas o mais emocionante, foi São Raimundo X Rio Negro, pelo campeonato de 1966, disputado dia 21/05/1967.

Após a partida, diversos torcedores caíram da arquibancada que estava sendo reformada e algumas tábuas que estavam sendo usadas como passarela, escorregaram, fazendo com que caíssem de uma altura aproximada de 3 metros. Muitos feridos e um único óbito: Porfírio, um torcedor do Rio Negro, que foi atendido no Hospital SAMDU, na Silva Ramos, mas, depois de alguns dias, não resistiu aos ferimentos e veio a falecer.

No Parque também jogou o time do Flamengo,(que viria a ser tricampeão carioca de 1953/54/55), contra o nosso Fast, aplicando uma goleada de 6 X 1, no dia 31/03/1950. Outros jogos muito importantes aconteceram, nesse que foi o primeiro Estádio de nossa capital. Lembro de um Rio Negro 3 X 0 Paissandu em que ao final do jogo, assisti ao Segadilha desferir um potente murro no queixo de um torcedor do Paissandu, fazendo-o dormir por alguns minutos, beijando o cimento quente da escadaria que dava acesso ao logradouro.

O último jogo nesse Estádio, foi em 08/07/1973, entre Rio Negro 3 X 1 Rodoviária, no qual o jogador Osmar, vindo do futebol paraense, marcou os três gols e Sudaco, que jogara no Fluminense do Rio e estava no futebol paraense antes de vir jogar em Manaus, descontou para o time da Rodoviária.

O Estádio Vivaldo Lima, acabara de ser inaugurado e, os jogos no antigo Parque Amazonense, começaram a rarear, tornando impossível o pagamento das mensalidades(o local havia sido arrendado para o Time do América dos irmãos Teixeira, Arthur e Amadeu), e, em conseqüência, entregaram-no ao Proprietário e assim, acabou sendo demolido, aquele que ficou conhecido como o Campo da Linha Circular, por causa da linha de bonde que passava em frente chamada de Linha Circular.

Por fora do terreno pertencente à área do Parque Amazonense, a ACLEA (Associação dos Cronistas e Locutores do Estado do Amazonas), construiu as Cabines de Rádios, denominadas de Pavilhão Gilberto Mestrinho, inaugurada no primeiro governo do Professor. Quando em 1976 o então proprietário demoliu as arquibancadas, demoliu também a dita cabine, que curiosamente não foi reclamada pela ACLEA, mas…essa é uma outra história!

Na década de 1960, nós moleques da redondeza, usávamos de um artifício incomum para entrarmos sem pagar, nos jogos realizados no Parque Amazonense: esperávamos a bola ser chutada e cair no meio da rua, disputávamos com outros garotos e, aquele que saísse vencedor, tinha o “passaporte” para entrar, era só devolver a pelota e podia ficar no Estádio. Atrás do gol que dava para o Beco do Macedo, os moradores “construíram” uma arquibancada em cima de um abacateiro, de onde podiam assistir aos jogos sem pagar e confortavelmente instalados.

Os cronistas e locutores da época, desciam a pé para suas residências e todos se conheciam e se cumprimentavam. Carlos Carvalho, Orlando Rebelo, Leal da Cunha, Arnaldo Santos, Luiz Eduardo, José Augusto, Jaime Barreto. Passavam todos em frente às casas e gritávamos cumprimentando-os. Eles acenavam e sorriam para nós. Era a época em que Manaus terminava no Boulevard Amazonas, após vinha o Seringal Mirim, onde existiam uma feira e a seguir, os batuques da Joana e à esquerda, entrando para a João Alfredo, o tradicional Maracanãzinho do Mestre Duca, onde fizemos partidas memoráveis contra o juniores dele. Sempre levávamos vantagem, dificilmente perdíamos uma partida.

Na época áurea do Parque Amazonense, todos nós moleques amantes do futebol, andávamos com nossos radinhos de pilhas grudados aos ouvidos para escutarmos as resenhas esportivas, para sabermos das novidades, as informações, escalações de nossos times preferidos. Toda Manaus parava para ouvir “A bomba do dia”, de Geraldo Viana, repórter que sempre trazia uma novidade em primeira mão e que um dia “a bomba” foi uma notícia sobre ele mesmo, que havia sido flagrado fumando maconha. Foi embora de Manaus e nunca mais voltou. Soube que faleceu há alguns anos. Uma pena, foi o repórter-sensação em nossa cidade, muito conhecido e querido por todos nós.

Tanto no velho e tradicional Parque Amazonense, como na Colina (Estádio Ismael Benigno), o futebol amazonense era bem freqüentado e disputado, a cidade acordava com o barulho dos fogos de artifício, havia carreata com torcedores principalmente quando era domingo de Rio-Nal. Os torcedores do Nacional saíam em carreata com um leão, símbolo do Clube à frente e o Rio Negro, com a Charanga e o Galo Carijó de símbolo. Era uma festa em nossa cidade nos domingos de Clássicos. Lembro até hoje das escalações dos principais times de nossa Manaus:

Nacional: Zé Carlos, Antonio Piola, Sula, Waldomiro e Théo, Mário e Rolinha (ou Rômulo e Holanda), Zezé, Rangel, Pretinho e Pepeta.

Rio Negro: Clóvis, Caboré, Catita, Chicute e Walter, Nonato e Ademir, Rubens, Sabá, Tomás e Aírton(Paulinho)

Fast : Pedro Brasil, Pompeu, Rato, Prado e Nivaldo, Nonato e Santana, Laércio, Zezinho Walmir e Bezerra.
São Raimundo: Waldir Melo, Paulinho, Waldir Santos e Zezinho, Fredoca e Itagiba, Melo (ou Augusto), Aírton, Santarém e Almir.

Olympico : Dari (Procópio), Sidney, Faustino, Russo e Salles, Xerém e Jarbas, Cascadura, Irailton, Gilberto e Santiago.

Alguns jogadores eram um show a parte, como Marialvo do Nacional, goleiro que agarrava até pensamento e batia penaltes como ninguém. Clóvis que criou o tabu da toalha vermelha, colocada atrás do gol e que segundo alguns , fechava a meta; a verdade é que dificilmente era vazado! Outras linhas de ataques também ficaram famosas, como: Rubens, Jedir, Milton Marabá e Paulinho (Anísio). Pelo Rio Negro; Laércio, Afonso, Edson Piola e Bezerra, pelo Fast; Dos jogadores amazonenses, achava foras de série, o Dermilson, o Pepeta, o Orange e o Paulinho, ponta esquerda do Rio Negro, mas o melhor mesmo foi o Edson Piola, o maior craque amazonense que vi jogar. Para mim, um atleta que jogaria como titular, em qualquer time do eixo Rio/São Paulo.

Parque Amazonense, palco de verdadeiros clássicos do futebol caboclo, acabou-se, perdeu-se no tempo e no espaço, restando apenas as lembranças dos domingos festivos em uma cidade que também perdeu a inocência, a tranqüilidade, a brejeirice e a paz, detalhes apenas vistos em uma cidade provinciana dos anos dourados,tudo destruído pelo progresso avassalador que se abateu no final dos anos 60 e início dos anos 70, com o advento da Zona Franca de Manaus…

*Almir Carlos, é professor e pedagogo e escreve parqa o Portal histórias ou estórias da Manaus antiga.
Obs: Os artigos assinados não refletem a opião do Portal e são de inteira responsabilidade de seus autores.

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