Marcelo Ramos, Presidente da Comissão da Previdência diz que vitória na CCJ não foi do governo, os partidos de centro aprovaram o texto

Deputado Marcelo Ramos, presidente da comissião especial da Reforma da Previdencia Social, durante gravação do Pode 360 entrevistas. Brasilia, 26-04-2019. Foto: Sérgio Lima/PODER 360

Brasilia – Marcelo Ramos (PR-AM), presidente da Comissão da Previdência, diz que a PEC passou na  CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) porque os deputados moderados do Centrão quiseram. “Pela relação com o governo, ninguém aprovaria nada na CCJ. O governo não ganhou aquela votação. Quem ganhou foi o Brasil”, disse ele em entrevista ao Poder360.

A íntegra da entrevista

O presidencialismo de coalizão, tão criticado pelo governo, “é bom”, na avaliação de Ramos. “O problema não é o cargo. É usar o cargo para corrupção. Tem de combater a corrupção, não o modelo”

Ramos diz não ter simpatia pelo governo, mas releva o fato de que Bolsonaro ficará mais forte com a reforma. “O presidente Bolsonaro passará. O Brasil ficará”.

Na sua avaliação, Bolsonaro tem hoje perfil duplo. “Ele foi um parlamentar vinculado ao populismo, a medidas de irresponsabilidade fiscal, e virou 1 candidato a presidente liberal. Todas as vezes em que ele é confrontado sobre esses dois Bolsonaros, o parlamentar, que talvez seja o que ele é mesmo, e o candidato, ele tende ao populismo”, afirmou.

Ramos diz que a oposição poderá obstruir, mas só dentro do regimento. “Se alguém acha que vai fazer da obstrução 1 instrumento de impedir que chegue à etapa de votar o projeto, pode tirar essa ideia da cabeça“, afirmou.

Poder360 – É possível contar com a aprovação da Reforma no plenário da Câmara ainda no 1º semestre?

Marcelo Ramos  –Esse é o esforço do deputado Rodrigo Maia e o meu. Ele me delegou a missão de coordenar os trabalhos e eu farei todo o planejamento com a ideia de concluir em junho. Claro que existem fatores que independem da minha vontade. E o principal é o governo ter votos para aprovar a matéria. Minha função é garantir a estabilidade necessária, garantir o diálogo, para que a matéria seja colocada em pauta. A função de garantir os votos necessários é do governo, da liderança do governo, dos líderes dos partidos de centro. Mas eu quero crer que se criarem um ambiente como o da Comissão de Constituição e Justiça em sua parte final a gente consegue dar agilidade absoluta. Na CCJ, o projeto demorou 2 meses em tramitação. No dia em que se constituiu maioria, aprovou em 1 dia. Se tiver uma maioria em torno da proposta, a gente consegue fazer esse serviço ao Brasil, que é fazer uma reforma da Previdência que entregue 1 ajuste fiscal para que o país possa voltar a crescer.

O presidente Jair Bolsonaro tem mais ajudado ou atrapalhado a tramitação da reforma?

Eu sugeri que, se não for para ele defender integralmente a proposta que ele encaminhou, que ele não fale sobre a proposta até o final, porque ninguém até agora desidratou a reforma quanto ele mesmo. Ele falou da idade mínima, de BPC, de rurais, já disse que capitalização pode ficar para depois, e ontem deu uma declaração muito ruim, porque, no mesmo dia em que o governo anuncia que a economia seria não de R$ 1 trilhão, mas de R$ 1,240 trilhão, ele disse que se contenta com R$ 800 milhões. Portanto, ele já autorizou o corte de R$ 440 milhões. Isso é muito ruim. Cada concessão que o presidente faz, ele força o parlamento a fazer outra. O presidente tem de defender a proposta como ele encaminhou. Se não for para fazer isso, que ele nos ajude. Não fale sobre a proposta até que ela seja votada em plenário.

 Por que o presidente age assim?

Eu digo que o presidente é uma figura em disputa. O Bolsonaro parlamentar não é o Bolsonaro candidato e presidente. Ele foi um parlamentar vinculado ao populismo, a medidas de irresponsabilidade fiscal, e virou 1 candidato a presidente liberal. Todas as vezes em que ele é confrontado sobre esses dois Bolsonaros, o parlamentar, que talvez seja o que ele é mesmo, e o candidato, ele tende ao populismo. A manifestação sobre o aumento do diesel é 1 exemplo, e as manifestações sobre reforma da Previdência são outro exemplo. Eu espero que prevaleça o Bolsonaro candidato, o liberal, que mobilizou milhões de brasileiros, e não o populista.

O que travou a reforma na CCJ?

A ideia do governo de que é possível mandar um projeto à Câmara dos Deputados e aprovar sem nenhuma alteração na marra. Não é assim. E que bom que não é. Isso é saudável para a democracia. Força que saia uma proposta mediada. O que nós fizemos na CCJ? Talvez por isso eu seja hoje o presidente da Comissão Especial: eu apostei na moderação e no diálogo em 1 ambiente que era de extremismo e de intransigência. O Brasil não precisa disso. Quando o governo entendeu, construímos uma proposta que ampliou a base de apoio do governo e aprovamos em 1 dia.

Os deputados querem modificar a proposta ou querem outras coisas, como cargos no governo?

Posso dizer o que eu vejo: os deputados têm compromisso com o país. É meu 1º mandato de deputado federal. Com o tempo, o povo brasileiro vai perceber que há 1 profundo sentimento republicano nesta legislatura. O que os deputados querem é ser respeitados como um Poder independente. Participar ou não do executivo é outra questão. Isso é republicano em qualquer lugar do mundo: na Suécia, na Dinamarca, na Inglaterra.

Mas esses são países parlamentaristas.

Nós somos quase semi-parlamentaristas. Inventamos 1 modelo definido pelo Sérgio Abranches que é o presidencialismo de coalizão.

Bolsonaro não gosta do presidencialismo de coalizão. É um  bom modelo?

É bom. O problema não é o cargo. É usar o cargo para corrupção. Tem de combater a corrupção, não o modelo. Pela relação com o governo, ninguém aprovaria nada na CCJ. O governo não ganhou aquela votação. Quem ganhou aquela votação foi o Brasil. Vamos agir pensando no país. Quem me conhece sabe que eu não nutro simpatia por esse governo e pela forma de o presidente governar. Mas a minha antipatia por ele é infinitamente menor do que a minha responsabilidade para com o país. Se aprovar a reforma ele vai ficar forte? Que fique. É natural da política. Agora, 13 milhões de brasileiros desempregados passarem a ter a perspectiva de ter 1 trabalho, milhares de empreendedores que estão com os seus negócios paralisados voltarem a ter perspectiva de crescer, isso marca a história de qualquer homem público que participe desse processo. É muito maior do que qualquer simpatia ou antipatia pelo presidente da hora. O presidente Bolsonaro passará. O Brasil ficará, com o bem estar da nossa gente em 1 futuro próximo.

As críticas que o senhor fez à reforma como integrante da CCJ podem atrapalhar a sua atuação como presidente da comissão?

Eu preciso entender o papel que eu vou cumprir de agora em diante. Eu não posso mais ser o ativista de causas contra a reforma da Previdência. Eu tenho minhas convicções. Eu acho que é errada a aplicação do regime próprio dos servidores públicos federais para os estaduais e municipais. Eu vejo que não tem como pedir que 1 idoso ou deficiente de baixa renda contribua com o ajuste fiscal, e a reforma é isso, não gosto de enganar o povo. Preciso enfrentar a incompreensão na certeza de que o futuro mostrará que nós temos razão. Quem diz que a reforma é só para combater privilégios não fala a verdade para o povo brasileiro.

A reforma é para fazer ajuste fiscal. Ela também combate privilégios. E pede uma parcela de sacrifícios de médios e de pequenos que têm renda para que 50 milhões de brasileiros que não têm renda nenhuma possam ter uma no futuro. São os desempregados, os que desistiram de procurar emprego e os informais que ganham menos de 1 salários mínimo. O meu papel como presidente não me permite ser 1 ativista disso. Serei o magistrado desse processo. No momento certo, manifestarei o meu voto.

O senhor influenciará o relator?

Fiquei muito feliz com a nomeação do deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), 1 deputado muito experiente, muito mais do que eu. É 1 profundo conhecedor da matéria. Claro que nós dialogaremos, mas a responsabilidade pelo relatório é dele, ouvindo as lideranças, os demais membros da comissão.

A falta de estimativa para o custo da capitalização prejudica?

Sim, mas prejudica mais ainda o fato de o presidente ter declarado que a capitalização pode ficar para depois. Quando ele declarou isso, praticamente inviabilizou a ideia. Espero que o ministério mostre na tramitação o que significará para o regime geral uma mudança, o que vai ficar de buraco. Eu acho que deveríamos experimentar um modelo transitório, que é ter um sistema de repartição solidário, que garanta uma renda básica, e a capitalização como 1 regime complementar, o que foi feito em 2003 com os funcionários públicos, com a diferença de que em 2003 se criou uma regra com um fundo público, e eu não tenho preconceito. Se vai ser público ou privado é uma questão para quem vai guardar o dinheiro.

As novas contas do governo ajudam ou atrapalham a tramitação?

Ajudam, porque se fizer a conta tirando BPC, trabalhadores rurais, abono do PIS e professores ainda fica bem acima dos R$ 800 bilhões que o presidente falou.

BPC e aposentadoria rural sairão com certeza?

Eu acho difícil ficar. BPC e aposentadoria rural, os partidos que representam a maioria dos membros da Câmara assinaram que não votam. Seria uma desmoralização muito grande dizer “agora deixa”. Não vejo como recuariam. A gente tem outros caminhos para compensar.

Que outros pontos devem enfrentar mais resistência?

Idade mínima, até porque o presidente deu uma declaração para reduzir a idade mínima; as regras de transição, que são muito duras, e as corporações de servidores púbicos, que estavam muito paradas, vão começar a agir; e também esse debate sobre a aplicação das regras em estados e municípios. Vou sugerir que a gente faça uma audiência pública com governadores. Nos estados eles dizem que não querem, e esperam que a gente aprove para eles não arcarem com o ônus de discutir nas assembleias. Eu acho que esse item tem 1 problema jurídico. Entendo que tirara a autonomia dos estados e municípios de terem 1 regime próprio fere uma cláusula pétrea da Constituição, que é o sistema federativo. Prefiro 1 modelo como estava previsto na proposta do presidente Temer. O Congresso Nacional aprova e os estados por meio de suas assembleias têm 6 meses ou 1 ano para validar ou não.

O fato de existir uma reforma separada para os militares atrapalha?

Atrapalha. Eu acho que todo mundo tem uma justificativa para que a reforma só seja feita na casa do vizinho. O militar é porque tem de morar fora. O policial porque tem risco de tomar tiro. O médico porque é insalubre. Teria de juntar tudo. Não há razão para os militares terem uma proposta separada e misturada com uma regra de valorização salarial. Foi 1 erro. Mas não é por isso que nós vamos negar ao Brasil a chance de crescer.

Sobre os números, está satisfeito com o detalhamento até agora?

Vou conversar com o Ministério da Economia. Minha sugestão é de que as primeiras audiências públicas sejam com o ministro Paulo Guedes e o secretário Rogério Marinho. Um para o enfrentamento do debate político e o outro, dos números. Temos de tirar esse discurso da oposição de que não tem os números. Até porque ser opaco é coisa da velha política. Da nova politica é ser transparente. A exigência para que o governo apresente os números não é mais da oposição. É da Presidência da Comissão. Se, na 1ª semana, a gente ouvir o ministro Paulo Guedes, ouvir o secretário Rogério Marinho, a gente ultrapassa uma etapa. Acho que devemos ouvir os governadores e abrir 1 espaço no processo de diálogo para ouvir as corporações de servidores públicos, que são fortemente impactados nessa reforma.

Como o senhor vai enfrentar a oposição?

Com o regimento interno. Conversei com os líderes da oposição e fiquei feliz. Fui para a Presidência não com o apoio, mas com o gesto de simpatia público do PT, PC do B e PSB, justamente pela moderação e pelo diálogo. Disse a eles que vou respeitar a obstrução nos estritos limites do regimento.

Tentar obstruir fora do regimento, não vão conseguir. E deixei claro a eles o seguinte: o mesmo regimento que dá direito à obstrução, determina que o projeto seja votado. Se alguém acha que vai fazer da obstrução 1 instrumento de impedir que chegue à etapa de votar o projeto, pode tirar essa ideia da cabeça.

O fato de ter sido do PC do B ajuda no diálogo com a oposição?

Ajuda por ter o respeito deles e por entender a lógica política de resistência, que é natural, que é democrática, ainda bem que existe. Eu não nego minha história. Tenho orgulho de ter sido do PC do B e do PSB. Essa trajetória guardou no meu coração 1 espírito humanista muito forte. O político não pode perder isso.

Agora, do ponto de vista do pensamento econômico, não foi 1 rompimento só por questão eleitoral. Eu deixei de pensar a economia e o mundo como eu pensava quando estava lá. Hoje eu sou 1 liberal. O direito à liberdade, à democracia, a ter 1 trabalho, a comer, isso é uma bandeira da esquerda ou da direita? Isso é uma bandeira civilizatória.

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