Inédito: Crime em reserva de Roraima será julgado por índios

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Roraima – Uma aldeia indígena no extremo norte de Roraima sediará, nesta quinta-feira (23), um júri popular integrado apenas por indígenas, o primeiro do Brasil.No banco dos réus, dois índios macuxis, acusados de tentativa de homicídio. O caso será decidido segundo a legislação penal.

A novidade é elogiada pelo Judiciário, mas antropólogos afirmam que os índios estão apreensivos com o resultado, que dará sentença sobre um caso que envolve um tabu das comunidades: a entidade maligna Canaimé.

A tentativa de homicídio ocorreu justamente porque os dois acusados desconfiaram que a vítima havia assassinado outros dois índios de forma brutal, crime atribuído ao Canaimé, e tentaram cortar seu pescoço.

O crime ocorreu em um bar da cidade de Uiramutã e eles foram presos em flagrante.

O temor é que se, após o julgamento, a vítima ficar com o estigma de ser mesmo a entidade maligna, ela possa acabar jurada de morte nas aldeias da região.

“Quando você mata um Canaimé, você não vai a julgamento, porque está livrando a comunidade de um mal”, exlica a antropóloga Lêda Martins, que estuda a tribo dos macuxis.

CONFLITOS

Outra possibilidade é que a sentença crie conflitos entre as lideranças indígenas. “Não será uma questão de consenso, como estão acostumados”, acrescenta ela, ao lembrar que a palavra final será dada por um branco.

Para o corpo de jurados, foram selecionados 30 índios de quatro etnias. Sete serão sorteados para o júri.

Normalmente, crimes que acontecem dentro dos territórios indígenas são decididos pelas lideranças locais, sem passar pela Justiça brasileira, ao contrário do crime em questão, ocorrido em território urbano.

Geralmente são brigas ou disputas que algumas vezes podem acabar em ferimentos ou mortes. As punições podem chegar à expulsão da aldeia, à realização de trabalhos comunitários e à proibição de participar de eventos por anos. Há uma espécie de “progressão de pena” em que o condenado é gradualmente reintegrado.

PENAS

Essas penas podem ser reconhecidas como legítimas se chegarem à Justiça. O juiz Aluizio Ferreira, que conduzirá o júri popular, já se absteve de sentenciar um índio acusado de homicídio sob o argumento de que ele havia sido punido pelos pares.

O magistrado diz que o caso a ser julgado na próxima quinta foi fruto de “convergência de vontades” entre as instituições do Estado e indígenas, que desejariam aprender com a lei brasileira.

“Temos que estar sempre de olho no auxílio às comunidades. Não basta que só haja demarcação de terras”, afirma Aluizio Ferreira.

Estarão presentes no julgamento 150 líderes de 72 comunidades, que se reunirão logo depois do encerramento do júri para avaliar suas consequências.

JURADOS

No sorteio dos jurados, foi levada em conta toda a população da região.

“Antes, os jurados eram sorteados somente na cidade. Se fizéssemos assim, apesar de 95% da população regional ser indígena, acabaríamos selecionando vários brancos para julgar dentro de local com ar-condicionado”, diz o juiz.

Oficialmente, os representantes dos índios não têm se manifestado sobre o julgamento de quinta-feira.

“Só vamos dizer se achamos que será bom ou ruim antes do júri começar, com todas as lideranças”, diz Júlio Macuxi, um dos coordenadores do julgamento.

Embora existam macuxis advogados, o caso que envolve discussão sobre o Canaimé ficou nas mãos de um defensor público não indígena.

Amazonianarede-agencia Folha

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