
Viver sem poluir é praticamente impossível. Este mantra dos tempos modernos pode ser criticado aqui e acolá, mas, infelizmente é uma verdade por qualquer ângulo que analisemos.
Assim, no modelo de sociedade que vivemos raramente algum passo, movimento ou iniciativa será totalmente inofensivo ao meio ambiente. Em outras palavras, quase tudo que fazemos, de alguma forma, acaba impactando os recursos naturais.
Obviamente, num mundo cercado por maiores cuidados ambientais, a tendência é que passemos a fazer coisas mais corretas; buscar escolhas mais saudáveis. Paradoxalmente, a grande questão é que há atitudes que não fazem o menor sentido.
São casos de como pagamos para poluir. Sim, isso mesmo. Gastamos recursos econômicos em atividades mais degradadoras. Vamos explicar.
Levando pedra pra cima de morro
A Zona Franca de Manaus (ZFM) produz uma série de bens de consumo do ramo eletro-eletrônicos.
Recentemente, adquiri um destes produtos pela internet. Por mais estranho que possa parecer, tal produto é mais barato se for pedir por esta forma de entrega do que sei formos, aqui em Manaus, numa loja e comprá-lo.
Pois bem. Se assim for, comprar pela internet equivaleria a curva-se a um ditado antigo, mas sábio: levar-se-ia pedra pra cima de morro. Ou seja, não precisaria, nem adiantaria. Foi esforço em vão e, pior, com seqüelas.
Ora, este produto saiu de Manaus (independentemente se de balsa ou avião) e gerou poluição em seu transporte, e agora fizemos a compra do mesmo, retornando para o mesmo ponto de origem.
Numa linha de raciocínio, de certa forma até lógica, pagamos para poluir. Sim. Pois se tivesse comprado diretamente na loja, teoricamente, a emissão de gases produzidos para seu transporte não seria a mesma, alias, seria ínfima.
A pegada – ecológica
Pelo menos na a contabilidade de poluição individual este é um retrocesso. Pode até ser que outra pessoa pedisse o produto em outro local do pais , gerando a mesma poluição. Mas o que está em jogo é a tal da “pegada-ecológica”, uma forma de medirmos nossas marcas ambientais em função do que fazemos no dia-a-dia.
Em suma, para mim, pessoalmente, houve ume pegada negativa.
Este tipo de decisão, tomada a toda hora (já que vivemos na era do “shopping” no sentido geral da palavra), é algo até que corriqueiro. Não dá muito pra fugir disso. O que pode ser diferente, contudo, é o formato de compra que podemos escolher ou não.
Alguém pode sustentar que isso é “malhar em ferro frio”, pois não tem como fazemos diferente; que ao fim alguém vai fazê-lo; que só de pensar nisso já dá uma trabalheira que nem vale a pena.
Mas, se não dá pra viver sem poluir ao menos dá pra tentar incluir ideias pra mudar este cenário. Não ocorreu-me, até agora, nenhuma grande idéia (no cenário político ou tecnológico) para atenuar este impacto. Qual seria a saída?
Ainda não amadurecemos quando o tema é consciência ambiental. Crianças, supostamente mais propensas e receptivas às novas ideias, dão provas que estamos longe disso. Nas escolas o assunto é tratado como algo novo, mas só isso. Temos que ir além. Basta olhar para trás e ver que após 20 anos de apuradas discussões e mudanças nos padrões educacionais sobre o tema de pouco adiantaram.
Por exemplo, pensava-se que agir maciçamente na mente dos mais novos, gerar-se-ia adultos mais afeitos à condutas simples, porém mais cidadãs e proativas. Pouco se avançou. Aliás, já discutimos aqui a ineficácia do padrão atual do uso dos livros didáticos (Leia: Ambientalmente, livros didáticos são inúteis).
Em tese, o erro estaria não na premissa (de que educação e consciência ambiental desde cedo fosse o caminho), mas no formato de como fazer isso.
Estas duas frentes de trabalho, por assim chamar, apesar de corretas não tem gerado muito resultado: ainda temos altos índices de desmatamento nas florestas; os números de poluição do ar nas cidades (veículos) não têm sido reduzidos; os rios, lagos e riachos (igarapés) nas cidades continuam imundos. Qual seria a saída?
Os meios necessários
Claro que moldar o pensamento dos pequeninos desde cedo é importante. Ninguém em faculdade normal em seu juízo diria o contrário. Mas, só isso é gota no oceano; enxugamento de gelo… De novo, qual a fórmula?
Didaticamente, pode se dividir a busca pela consciência ambiental por dois meios. O primeiro é por meio de campanhas publicitárias e inserção de temas nos livros da garotada, como já dito. Seria a parte da prevenção. Até ai tudo bem.
O outro jeito é a repressão nos mais velhos (adultos e enquadrar-se-iam ai também os poluidores natos, empresas etc) que burlam ou vão contra a lei. As regras mandam condenar os infratores: multas, pagamento de valores, reparação do bem e (raramente) prisão. É o aprendizado na marra.
Alternativas
Um terceiro foco até que tem sido trabalhado, mas timidamente: os incentivos fiscais, econômicos ou ferramentas financeiras para quem melhora o ambiente ou deixa de poluí-lo. Um exemplo é o imposto ecológico – ou seja, uma redução na carga tributária para quem faz algum tipo de atividade pró-natureza. Alguns estados já vêm trabalhando na idéia, como Paraná, São Paulo.
O Amazonas timidamente tentou algo parecido no ` Programa Zona Franca Verde ´, mas no papel funcionou mais que na prática. Dezenas de outros pequenos formatos indiretamente tentam reproduzir o incentivo econômico a quem respeita os recursos ambientais (como redução no imposto rural para quem tem reserva legal). Mas falta uma política realmente forte neste ramo.
O que se vê, contudo, é o folclore e o romantismo em torno da questão. Há um vasto campo a ser percorrido em novas leis, normas, campanhas e incentivos.
Não necessariamente só punindo, mas trazendo quem ainda não entrou no jogo utilizando de recompensas. Iscas palatáveis. Afinal, ninguém é altruísta somente porque é bonzinho; o faz, sobretudo, porque lhe é devida e prometida uma vantagem. É assim em qualquer ramo onde o homem atua. Por que seria diferente com a questão ambiental? Precisamos amadurecer.
*Ronaldo Santos é engenheiro agrônomo, servidor federal de carreira, no INCRA,AM e acadêmico de direito.