Câmara não pode dar “asilo” a mensaleiros, diz Barbosa

Amazonianarede – Veja

Brasília – O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, desqualificou nesta quinta-feira a interpretação de que o Congresso poderia ser usado como abrigo para evitar a prisão dos três deputados mensaleiros condenados – Valdemar Costa Neto (PR-SP), João Paulo Cunha (PT-SP) e Pedro Henry (PP-MT). A decisão sobre a prisão imediata dos condenados será anunciada amanhã por Barbosa, em resposta a um pedido do procurador-geral da República, Roberto Gurgel.

Nesta quinta-feira, o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), que tem dado sucessivas declarações sugerindo que a Casa deve partir para o enfrentamento com a Suprema corte, não descartou a possibilidade de abrir os portões da Câmara para abrigar os mensaleiros, já que a Polícia Federal não poderia entrar no Congresso para prendê-los. O petista afirmou que a prisão dos parlamentares, na sua opinião, seria inconstitucional. “Uma das coisas que a Constituição previu de forma sábia é que nenhum parlamentar pode ser preso a não ser em flagrante delito ou depois de condenação transitada em julgado, o que significa que a Constituição é muito clara em relação à impossibilidade da prisão de parlamentares. Nós temos que aguardar os acontecimentos para ver qual o impacto e o que isto vai significar do ponto de vista do posicionamento que o Parlamento e a Câmara dos Deputados irão tomar em relação a essa situação”, disse o deputado.

Barbosa reagiu: “O deputado Marco Maia não será a autoridade do Poder Legislativo que terá a incumbência de dar cumprimento à decisão do STF. O que ele diz hoje não terá nenhuma repercussão no futuro ou no momento adequado da execução das penas decididas pelo plenário”. As declarações foram feitas durante apresentação do balanço dos trabalhos do STF no ano.

Responsável pela maior parte dos votos que levaram, ao final do julgamento do mensalão, à condenação de 25 políticos, empresários e banqueiros, Barbosa ainda classificou a tentativa de proteger os mensaleiros como uma dos mais graves atentados à Constituição. “A proposição de uma medida dessa natureza de acolher condenados pela Justiça no plenário de uma das Casas do Congresso Nacional é uma violação das mais graves à Constituição brasileira”, criticou o magistrado.

Jurisprudência

Barbosa disse nesta quinta-feira estar diante de uma “situação nova” em relação à possibilidade de prender imediatamente os condenados que ainda podem apresentar recursos. De acordo com o magistrado, não existem precedentes na corte sobre o tema. Por haver peculiaridades em cada caso, Barbosa disse que decisões anteriores de ministros contrárias a execuções antecipadas de penas são têm o mesmo contexto do escândalo político do mensalão.

“Quando o tribunal decidiu (sobre execuções antecipadas de pena), foram decisões de casos que tramitaram em instâncias inferiores. Chegaram aqui (no STF) em habeas corpus. É a primeira vez que o STF tem que se debruçar sobre um pedido de execução da pena definida por ele mesmo”, disse o ministro, que atuou como relator do mensalão e foi responsável pela maioria dos votos favoráveis à condenação dos réus. “Não temos jurisprudência. Estamos diante de uma situação nova”, resumiu.

Em 2009, por exemplo, o plenário do STF decidiu ser inconstitucional a possibilidade de execução imediata da pena antes do trânsito em julgado da sentença. Na ocasião, o Ministério Público tentava garantir a prisão do produtor de leite Omar Coelho Vitor e argumentava haver risco de fuga. O empresário foi condenado por tentativa de homicídio duplamente qualificado e, assim que começou a vender seus rebanhos de gado holandês, em uma sinalização de que poderia fugir. O pedido do MP foi rejeitado pelo plenário da corte. Foram votos vencidos na ocasião a ministra Cármen Lúcia e o próprio Joaquim Barbosa.

O relator do mensalão informou ainda nesta quinta-feira que o Ministério Público já havia pedido a prisão dos mensaleiros na época em que ainda eram investigados, e não réus. “Esse pedido já foi formulado antes nessa ação penal e eu indeferi logo no início. No início da instrução foi feito esse mesmo pedido e, na época, falei de maneira um pouco jocosa que, se decretasse prisão dos então acusados, o processo não se moveria um palmo. Foi uma decisão de ordem pragmática. O momento é outro”, disse.

Mandatos

Barbosa voltou a citar a diferença entre o papel do Congresso Nacional, que pode fazer um juízo político de seus pares e determinação a cassação de seus mandatos, das decisões judiciais tomadas pelo tribunal nas 53 sessões plenárias do mensalão. “O Parlamento, quando cassa um parlamentar por quebra de decoro, tem total liberdade para fazer a avaliação sobre o tipo de deslize funcional desse parlamentar”, disse. E exemplificou: “Pode cassar o mandato até mesmo de um parlamentar que tenha cometido um crime culposo de trânsito”. “O juízo que é feito pelo Parlamento é politico. Aqui não. Quando o STF decide condenar alguém por crimes graves, e ao mesmo tempo decidir pela perda do mandato, está cumprindo a Constituição Federal e determinando a consequência da condenação criminal, porque o processo transcorreu aqui mesmo no STF”, argumentou o ministro.

O presidente do Supremo novamente esclareceu o papel de cada Poder da República e disse que a postura de Maia, inclusive de afirmar que é o Congresso quem escolhe os ministros da mais alta corte do país, é reflexo de “desconhecimento puro do funcionamento das instituições políticas brasileiras”.

Os ministros do STF são indicados pelo presidente da República, sabatinados na Comissão de Constituição e Justiça do Senado e têm os nomes levados a voto dos senadores em plenário. “Não é o Parlamento quem nomeia ministro do Supremo. Quem nomeia é presidente da republica, que ouve o Senado. A utilização pelo juiz dos poderes que lhes são atribuídos pela Constituição Federal em nenhum momento tem a mínima chance de configurar ações suscetíveis de caracterizar um impeachment. Há erro grosseiro de análise das instituições brasileiras”, disse Barbosa. “Desse processo (de escolha dos ministros do STF), aliás, não participa o presidente da Câmara dos Deputados.”

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