O sistema Rede Globo analisou mais de 3.500 registros na agenda da Presidência da República para montar a ‘rede’ do presidente; saiba quem mais esteve no Planalto nos últimos dois anos
Brasilia – O presidente Michel Temerteve encontros oficiais com 55% do Congresso desde que assumiu a Presidência da República, em maio de 2016, quando Dilma Rousseff foi afastada do cargo. Ele recebeu 269 deputados e 57 senadores em exercício. Os dados são resultado de um levantamento feito pelo G1 com base na análise dos mais de 3.500 registros da agenda no site do Palácio do Planalto. O governo de Michel Temer completa dois anos neste sábado (12).
Temer teve compromissos com 52% dos 513 deputados e com 70% dos 81 senadores. Nesses dois anos, os nomes mais frequentes na agenda do Palácio do Planalto foram: Eliseu Padilha, ministro-chefe da Casa Civil; Moreira Franco, ministro de Minas e Energia; e Henrique Meirelles, ex-ministro da Fazenda.
A análise realizada pelo Sistema Globo identificou ainda que o presidente não esteve, desde que assumiu a Presidência, em apenas seis estados do Brasil: Acre, Amapá, Amazonas, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe.
Os governadores de quatro deles (Acre, Amapá, Amazonas e Piauí) são do PT e do PDT, que não participam de sua base. Já os governadores de Rio Grande do Norte e Sergipe são do PSD.
Apesar de não ter viajado aos seis estados, Temer teve compromissos oficiais com parte deles em Brasília. Os governadores mais assíduos do Palácio do Planalto foram os do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão(MDB), e do Rio Grande do Norte, Robinson Faria (PSD).
A Secretaria de Comunicação da Presidência da República diz que o presidente se reúne rotineiramente com os representantes de todas as unidades da federação. “O presidente tem a disposição, até o fim do seu governo, de comparecer a todos os estados do país, porque a retomada da economia e as obras do governo federal beneficiam todos os brasileiros, de todos os estados”, afirma a nota.
Nos dois anos de governo, o estado mais visitado foi São Paulo, onde Temer também tem uma casa, em Alto de Pinheiros, na Zona Oeste.
A agenda do presidente mostra compromissos oficiais em 14 municípios do estado: Americana, Barretos, Campinas, Caraguatatuba, Itu, Jaguariúna, Limeira, Mogi das Cruzes, Praia Grande, Ribeirão Preto, Santos, São José do Rio Preto, São Paulo e Sorocaba.
Desde 12 de maio de 2016, quando assumiu a Presidência, ele visitou 13 países. Em 2016, por exemplo, o presidente esteve na China, nos Estados Unidos, na Argentina, no Paraguai, na Índia e no Japão. Na América do Sul, desde o começo do governo, as viagens foram para Argentina (Mendoza e Buenos Aires), Chile (Viña del Mar), Peru (Lima) e Paraguai (Assunção).
Contrastes
Os deputados que estiveram com Michel Temer são filiados principalmente a MDB, PSDB, PP, DEM e PR – partidos que compõem a base do governo. Os mais assíduos da Câmara dos Deputados foram o presidente da Casa, Rodrigo Maia; o líder do governo, Aguinaldo Ribeiro(PP-PB); e o ex-ministro e deputado Antonio Imbassahy (PSDB-BA). Cada um teve mais de 80 encontros com Michel Temer nos dois anos de governo.
Para o cientista político Cláudio Couto, a agenda intensa com políticos do Congresso se deve a proposições que o governo definiu como prioritárias. Entre elas, a PEC do Teto dos Gastos (promulgada em dezembro de 2016), a Reforma Trabalhista (sancionada em julho de 2017) e a Reforma da Previdência (ainda em tramitação).
Couto diz, porém, que, em ano eleitoral, muitos dos candidatos podem evitar Temer, já que a proximidade com ele pode ser prejudicial. “Há um contraste crucial. Michel Temer é um presidente tão bem resolvido com o Congresso e tão mal resolvido com a população, a ponto de ele ser tão impopular que ninguém leva a sério uma candidatura Temer”, afirma o coordenador do mestrado de gestão e políticas públicas da FGV-SP.
Pelo menos 57 dos 81 senadores estiveram com Temer – o que equivale a 70% do Senado Federal. O recordista de agendas com o presidente foi Romero Jucá (MDB-RR), líder do governo no Senado. O senador de Roraima também teve papel ativo nos governos de Dilma Rousseff e Lula.
Em ambos os governos, Jucá também atuou como interlocutor do Planalto com o Congresso, na função de líder do governo no Senado. No governo Lula, ainda foi ministro da Previdência Social.
Depois de Jucá, os senadores Eunício Oliveira (MDB-CE), Aécio Neves(PSDB-MG), José Serra (PSDB-SP) e Ciro Nogueira (PP-PI) foram os que mais tiveram compromissos oficiais com Michel Temer. Nos dois anos de governo, Jucá esteve pelo menos 78 vezes com Temer; Eunício Oliveira, 34 vezes; Aécio Neves, 23 vezes; José Serra, 19; e Ciro Nogueira, 16.
Por período
Por enquanto, o mês com o maior número de agendas foi julho de 2017. Foram 284 compromissos oficiais. O presidente da República esteve em Hamburgo, na Alemanha, para a reunião dos chefes de Estado do G20, e viajou para Mendoza, na Argentina, onde se encontrou com representantes do Mercosul. Também foi ao Rio de Janeiro e se reuniu em Brasília com deputados, senadores e ministros.
Isso não significa necessariamente, no entanto, que o presidente tenha se reunindo com mais pessoas naquele momento. Um registro na agenda do Palácio do Planalto pode informar tanto “despacho interno” quanto “bancada feminina da Câmara dos Deputados”. Na maioria dos registros, porém, a Presidência da República costuma publicar os nomes de quem foi recebido pelo presidente.
No levantamento do G1, é possível constatar ainda que o presidente da consultoria Arko Advice, Murillo Aragão, por exemplo, esteve pelo menos oito vezes com Michel Temer. Já Denis Rosenfield, filósofo que foi cotado para o Ministério da Defesa, registrou 13 compromissos com o presidente.
Nos dois anos de governo, Temer ainda recebeu no Palácio do Planalto presidentes de variadas empresas, como montadoras de veículos (Volkswagen, Mercedes-Benz, Hyundai, MAN, Fiat, GM Motors etc) e telefonias (TIM e Claro).
Agendas oficiais de Michel Temer
Número de compromissos oficiais
mai/2016jun/2016jul/2016ago/2016set/2016out/2016nov/2016dez/2016jan/2017fev/2017mar/2017abr/2017mai/2017jun/2017jul/2017ago/2017set/2017out/2017nov/2017dez/2017jan/2018fev/2018mar/2018abr/2018mai/2018050100150200250300
O cientista político Cláudio Couto afirma que Temer é um “representante orgânico da classe política tradicional” e tem mais habilidades com o Congresso que sua antecessora, Dilma Rousseff. Couto lembra ainda que Temer já comandou a Câmara dos Deputados e presidiu o MDB por mais de uma década.
“A Dilma [Rousseff], diferentemente, não era uma política profissional. Muito pelo contrário. A Dilma tinha muita dificuldade de negociação, de conversar com os parlamentares. E isso ficou explícito, foi uma das dificuldades que ela enfrentou”, diz Couto, referindo-se ao processo de impeachment.
Temer x Dilma
O desenvolvedor de software Álvaro Justen, do Brasil.io, projeto que disponibiliza dados públicos em formato acessível, extraiu as agendas da ex-presidente Dilma Rousseff do site da Presidência da República. O período analisado engloba os compromissos oficiais de 1º de janeiro de 2011 a 1º de janeiro de 2013 – ou seja, dois anos do primeiro mandato da petista.
Foram 2.455 registros de agendas oficiais em dois anos do governo de Dilma Rousseff – cerca de mil a menos que Michel Temer. A ex-presidente, porém, viajou a mais países em comparação a seu sucessor. Dilma esteve em 23 países durante o período – o que inclui África do Sul, Moçambique e Angola. Temer, por enquanto, não visitou o continente.
Por outro lado, a ex-presidente esteve em menos estados do Brasil que Michel Temer. Nos dois primeiros anos de governo, Dilma Rousseff deixou de ir a Acre, Amapá, Espírito Santo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraíba, Piauí e Roraima. Na época, os governadores de Pará e Roraima eram do PSDB; e os de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, do PMDB.
Já os governadores de Amapá, Espírito Santo, Paraíba e Piauí eram do PSB. O Acre já era governado na época por Tião Viana, do PT.
A análise identificou ainda que a agenda da ex-presidente Dilma registrou menos encontros com deputados e senadores que a de Michel Temer. As pessoas mais próximas à ex-presidente foram, em ordem:
- Guido Mantega, então ministro da Fazenda;
- Gleisi Hoffmann, então ministra-chefe da Casa Civil;
- Miriam Belchior, então ministra do Planejamento;
- Edison Lobão, então ministro de Minas e Energia;
- Aloizio Mercadante, então ministro de Ciência e Tecnologia e, posteriormente, ministro da Educação.
Transparência
A divulgação da “agenda de reuniões com pessoas físicas e jurídicas” é uma das orientações do Código de Ética dos agentes públicos em exercício na Presidência e na Vice-Presidência da República, em vigor desde 2002. O internauta pode consultar, por dia, na agenda da Palácio do Planalto os nomes dos participantes, o horário e o local do encontro.
Não há informação sobre o assunto tratado em cada compromisso. O site também não permite a consulta por nome nem apresenta um arquivo consolidado com as agendas da semana, do mês ou do ano.
O G1 enviou um “requerimento de adoção de providência por parte da administração” em que pede para a Presidência da República passar a oferecer o download dos dados da agenda em seu site, com o objetivo de facilitar análises e consultas de cidadãos. Ainda não houve resposta.
Segundo a Secretaria de Comunicação, o site com as agendas da Presidência da República é atualizado diariamente em três momentos: às 13h, às 18h e no fim do expediente. Uma prévia da agenda é enviada aos jornalistas por e-mail, na véspera.
“Para dar máxima transparência, toda vez que há alteração, seja inclusão ou exclusão na agenda presidencial – o que ocorre com frequência, várias vezes ao dia –, a Secretaria de Imprensa adotou a boa prática de informar os novos nomes aos jornalistas lotados no Comitê de Imprensa, antes mesmo de as atualizações serem publicadas [no site]”, diz a nota.
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