A Praça do Congresso – Parte I

13-07almirAmir Carlos*

A Praça do Congresso, situada entre as ruas Ramos Ferreira e Monsenhor Coutinho, recebeu esse nome em vista de um Congresso Eucarístico que aconteceu salvo engano, em 1949. Local muito frequentado pela juventude dourada nas décadas de 1970/80. Majestosamente de frente para a Avenida Eduardo Ribeiro, a principal artéria de Manaus, tendo a Escola Normal (IEA) como cenário de fundo e, sem deixar de citar o Instituto Benjamin Constant, que nessa época, funcionava com o sistema de Internato de moças (vale citar que essa Escola teve a melhor Banda Musical de nosso Estado, toda, claro, formada por mulheres e que, num concurso nacional, ficou em segundo lugar, perdendo apenas para a do Ceará, terra do então Presidente Castelo Branco); à direita a residência do Comandante Militar da Amazônia; à esquerda a Residência do Doutor Gesta e um pouco mais à frente, onde hoje está uma Agência dos Correios, o saudoso prédio da Saúde Pública, onde todos nós íamos em busca de tratamento e vacinação contra as diversas doenças.

Onde hoje está situado um Edifício, que vez por outra “treme”, inclusive apelidado de “balança mais não cai”, era o Palacete da família de Maximino Corrêa e em frente ao Palacete, o belíssimo Ideal Clube, tendo ao lado, a residência do maior industrial da região, Isaac Benayon Sabbá, nosso muito conhecido, I. B. Sabbá e, em frente um prédio antigo, onde funcionou um bar e hoje funciona a Biblioteca Pública Municipal.

O principal lugar para nós, jovens da época, era a Lanchonete Pinguim, ao lado da casa do Comandante Militar, o “point” . Lá se comia o mais saboroso pastel, saboreava-se o melhor sorvete e o Chopp mais gelado… Todos convergiam para essa lanchonete, pois as pessoas mais bonitas de Manaus, frequentavam esse local! Ficávamos dando voltas de moto ou de carro pela Praça, subíamos e descíamos a Eduardo Ribeiro que à época funcionava em mão dupla e dávamos uma paradinha no recinto para checar nossas popularidades. Ficávamos por ali alguns minutos e depois saíamos para paquerar e mais tarde voltar, já na hora da saída das alunas…isso era de manhã, à tarde e à noite…

Eu, Anchieta e Jaime, éramos estudantes do Colégio Estadual do Amazonas, o famoso Ginásio. Estudávamos pela manhã. As aulas terminavam às 11:30. Saíamos do Colégio, descíamos a Sete de Setembro entrávamos na Eduardo Ribeiro e íamos paquerando as moças que trabalhavam nas lojas (não existia esse formigueiro de camelôs, dava para ver as lojas e óbvio, as lindas vendedoras).

Andávamos devagar, tranquilamente, sem medo de nada, sem sobressaltos… subíamos até o Pinguim, para continuar nossas paqueras, agora com as alunas do IEA (posso afirmar que éramos bem sucedidos, marcávamos um cineminha à tarde em algum dos cinemas existentes na cidade e que já citei em outra crônica e passávamos horas e horas felizes, com nossas novas conquistas). Ficávamos por lá até as 12:00, quando ouvíamos em algum rádio a música: “pãrãrãpãpãpãpãpã. Pãrãrãrãpãpãpã.

Na palavra do Radialista Josué Cláudio de Souza, a Crônica do Dia: _ “Senhoras e senhores ouvintes, nossa saudação amiga!” …essa era a senha para corrermos em direção às nossas casas, pois nossos pais estavam chegando para o almoço…Caso chegássemos ouvindo: “_ “_Senhoras e senhores ouvintes, até amanhã, como o Senhor nosso Deus há de permitir” ah!…era uma bronca tão forte, que preferíamos levar uma porrada!

Lembro que uma certa noite, estávamos eu e alguns amigos voltando para casa, após uma farra no Paquera`s, barzinho localizado nas esquinas das ruas Dez de Julho/Eduardo Ribeiro, bem ao lado do Magnífico Teatro Amazonas e, paramos no Pinguim para tomar a “saideira”. Fomos praticamente expulsos, o relógio marcava 00:30h de uma quarta-feira. Levantamos e fomos andando, em direção às nossas casas por cima da calçada da casa do Comandante, na época o General Jahsen. Íamos andando e falando alto.

O soldado de vigia, mandou que nós descêssemos da calçada e calássemos. O Luiz Mário muito afoito e sob o efeito das “geladas”, mandou o soldado tomar no c…Não chegamos à Ferreira Pena e um Jeep do Exército, dobrou na contra-mão e nos cercou.

Conclusão: todos detidos e levados para o Casarão da Marechal Deodoro, até mais ou menos às 05:00h. Fomos salvos pelo Coronel Paulo Figueiredo, que por nossa sorte, morava na mesma rua que nós. Ele, não sei por que cargas d`água, estava na Chefatura de polícia e argumentou que éramos jovens, amigos do filho dele, de boa família, etc, fomos liberados, mas…só poderíamos sair, com a presença de nossos pais…respondemos que pelo adiantado da hora, compareceríamos no outro dia…nossos pais se estivessem vivos, saberiam agora, por que chegamos pela manhã em casa…

Outro fato bem interessante acontecido na Praça, foi a célebre porrada entre alunos do IEA contra os alunos do Colégio Militar, os quais levaram uma tremenda surra e depois covardemente, soldados do exército, prenderam alguns alunos do IEA e os torturaram covardemente…mas, isso é uma outra história…

A Praça do Congresso, começava a fervilhar, desde cedo, pois algumas alunas propositalmente, chegavam atrasadas e ficavam pelos bancos conversando conosco, que também “gazetávamos” aulas. Era no entanto, muito saudável, com raras exceções de alguns que fumavam maconha, mas, tudo em decorrência da imaturidade e do glamour que isso causava. Hoje alguns são famosos, ocupando lugares de destaques na política, no social e na Justiça…

Não posso falar da Praça do Congresso, do Instituto de Educação, sem prestar uma homenagem à grande Educadora Neuza Ferreira, Diretora da Escola, que primava pela disciplina e comportamento de seus alunos, fosse nas dependências ou fora do Estabelecimento de Ensino. Algumas vezes, vi alunos e alunas em desabalada carreira pela Monsenhor Coutinho para fugir do flagrante por estarem namorando, de farda, no horário das aulas…era uma verdadeira heresia…um sacrilégio.

O uniforme das alunas, suas famosas e sensuais saias plissadas não apresentavam uma dobra fora do lugar e a altura deveria ser no joelho (as meninas enrolavam as saias na cintura, para nos mostrar um pouquinho mais de suas belas e torneadas pernas, assim como suas calcinhas, ao sentarem despreocupadamente nas escadarias em frente à Escola. O que ficávamos deveras agradecidos, pela generosidade). A Professora Neuza chegava sempre de supetão e, com o dedo, desmanchava as bainhas das saias muito “ousadas”. Impunha respeito, a Diretora, que ficou famosa, por buscar alunas do turno noturno, em lugares suspeitos…

Como as coisas mudaram! Hoje praticamente aboliram as saias, as escolas têm em seu fardamento, a calça jeans e fica em nossas mentes a música que embalava nossos corações juvenis, interpretada divinamente pelo inesquecível seresteiro Nelson Gonçalves:

“ Vestida de azul e branco,
Trazendo um sorriso franco,
No rostinho encantador,
Minha linda normalista,
Rapidamente conquista,
Meu coração sem amor…”

Eu que trazia fechado,
Dentro do peito guardado.
Meu coração sofredor…
Estou bastante inclinado,
A entregá-lo ao cuidado,
Daquele brotinho em flor…

Mas, a normalista linda
Não pode casar ainda,
Só depois que se formar…
Eu estou apaixonado,
O pai da moça é zangado,
E o remédio é esperar…

Éramos felizes e sabíamos! Nossa Manaus, não tinha sofrido essa onda de “invasão”, era uma cidade pacata de pouco mais de 500.000 habitantes. Nós nos cumprimentávamos nas ruas, nos conhecíamos. Sabíamos quem era de Manaus e quem era “de fora”.

Ás vezes penso que meu saudosismo é exacerbado, pois sou contra a Zona Franca de Manaus. No meu modo de ver as coisas e na minha leitura, não trouxe nenhum benefício social para nós, ao contrário, é só compararmos a Manaus de antes e a Manaus de hoje: prefiro a primeira, portanto…A mesma coisa penso da Copa do Mundo. Acho que sou o único amazonense contra a realização desse evento em nossa cidade. Imagino o que vai acontecer depois da Copa…como ficará nossa querida Manaus?

A Praça do Congresso hoje, é um palco do vazio, do nada que restou daquela beleza de outrora. Não consigo entender como é que nós deixamos um prefeito (com minúsculas), fazer o que fez com nosso principal reduto de encontros da juventude transviada cabocla. Fomos muito passivos, entregamos um bem público a um insensato que conseguiu destruir um dos lugares mais aprazíveis e saudáveis de nossa outrora Manaus-Sorriso! Que se levantem as vozes dos saudosistas e amazonenses natos, pois como bem disse meu amigo Papagaio: Manaus está tão “careada” e faltam tantos “dentes”, que ninguém conhece mais ninguém!

Amir Carlos* é pedagogo, professor e escreve neste Portal histórias ou estórias da Manaus antiga.

Os artigos assinados neste Site, são de inteira responsabilidade de seus autores.

 

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